Estou tão cansada, correndo tanto, que não estou tendo tempo para atualizar o blog. Para falar a verdade, ando mesmo é numa fase de não querer falar muito das minhas coisas. Um marasmo, uma canseira, um tombo após o outro... Sei lá, vou deixar para lá para ver se esqueço, ou se tomo coragem para dar um basta nas coisas e nas pessoas que me consomem sem me dar nada em troca. É isso mesmo, estou amarga hoje...
Por falar em estar amarga, essa eleição me desgastou demais. Meus últimos suspiros democráticos estão se esvaindo. Dilma e Serra se merecem: são feios, antipáticos e mentirosos, um casamento perfeito para uma eleição em clima de Dia das Bruxas.
Em homenagem a meu voto, transcrevo abaixo o texto do Zé Simão, da Folha de SP de 16-10-10. Faço das palavras dele as minhas.
sábado, 30 de outubro de 2010
UEBA!!!! VOU VOTAR NO DIABO!!
José Simão - Folha de São Paulo - 16-10-10
BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Piada pronta direto de Manaus: "Ladrões atacam bilheteria durante exibição de "Tropa de Elite 2'". Não tão respeitando mais nem o Capitão Nascimento! E a "Playboy" vai fazer uma versão pornô: "TREPA DE ELITE 2"! E a "Fazenda 3": "Tropa de Celulite 2"!
E manchete do UOL: "Líder conta que mineiros queriam abraçar a sonda". Claro, depois de 69 dias sem mulher, abraça qualquer coisa! "Oba, carne nova no pedaço!" E o segredo do Gerson era ficar espiando os mineiros pelo buraco! Rarará!
E como disse um amigo: "Eu gostava quando os mineiros eram underground, agora estão muito famosos!". A Geisy é minha ídala. Sabe o que ela disse na "Fazenda 3"? "Preciso de um PERSONAL TRAILER!" Rarará! E aí perguntaram: "Comida com "C'?". E ela: "CURRAL!".
E a Dilma parece um GPS engasgado: "Eu, não, sou, ã, a favor, ã, do aborto!". E o Pastor Serra vai botar pedágio até no Google Maps! E essa: "Para Marina, a religiosidade não pode ser ignorada". Mas pode ser IGNORANTE! Chega de religião. A eleição é no Brasil ou no Vaticano? Eu gostava do Plínio. Que grudou chiclete na mesa da Santa Ceia!
E achei um lugar onde a Dilma PACderme pode emagrecer e agradar aos religiosos: Clínica Médica Obesidade. E a placa ao lado: "Jesus é a solução!". Eu tenho a foto!
O Brasil virou o Irã! Acabei de receber o santinho do Serra: "Jesus é a Verdade e a Justiça, assinado José Serra". Quaquaquá! Então eu vou fazer outro: "Mulher Melancia é a Justiça e a Verdade, assinado José Simão". Assinado na bunda dela!
O Pastor Serra vai lançar o Bolsa Dízimo! A Dilma entrou nessa também! Uma confusão. Um mente-desmente. Estão fazendo uma suruba religiosa! E o "Financial Times": "Candidatos no Brasil debatem aborto". Entre parênteses: "O aborto ainda é proibido no Brasil". Tem de explicar, senão os gringos selvagens e atrasados não entendem.
E olha o e-mail que recebi: "Dilma é a serva de Satã". Ah, o Lula mudou de nome? Agora então é: Vampiro de Cristo x Serva de Satã. Ganhe quem ganhar, o Brasil perdeu! E avisa pra eles que, se Deus fosse gay, o mundo seria mais arrumadinho. Rarará!
Aborto, homofobia! O próximo presidente do Brasil será o homem de Neandertal! Deus! Ó Deus! Adeus! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno! EU VOU VOTAR NO DIABO!
simao@uol.com.br
BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Piada pronta direto de Manaus: "Ladrões atacam bilheteria durante exibição de "Tropa de Elite 2'". Não tão respeitando mais nem o Capitão Nascimento! E a "Playboy" vai fazer uma versão pornô: "TREPA DE ELITE 2"! E a "Fazenda 3": "Tropa de Celulite 2"!
E manchete do UOL: "Líder conta que mineiros queriam abraçar a sonda". Claro, depois de 69 dias sem mulher, abraça qualquer coisa! "Oba, carne nova no pedaço!" E o segredo do Gerson era ficar espiando os mineiros pelo buraco! Rarará!
E como disse um amigo: "Eu gostava quando os mineiros eram underground, agora estão muito famosos!". A Geisy é minha ídala. Sabe o que ela disse na "Fazenda 3"? "Preciso de um PERSONAL TRAILER!" Rarará! E aí perguntaram: "Comida com "C'?". E ela: "CURRAL!".
E a Dilma parece um GPS engasgado: "Eu, não, sou, ã, a favor, ã, do aborto!". E o Pastor Serra vai botar pedágio até no Google Maps! E essa: "Para Marina, a religiosidade não pode ser ignorada". Mas pode ser IGNORANTE! Chega de religião. A eleição é no Brasil ou no Vaticano? Eu gostava do Plínio. Que grudou chiclete na mesa da Santa Ceia!
E achei um lugar onde a Dilma PACderme pode emagrecer e agradar aos religiosos: Clínica Médica Obesidade. E a placa ao lado: "Jesus é a solução!". Eu tenho a foto!
O Brasil virou o Irã! Acabei de receber o santinho do Serra: "Jesus é a Verdade e a Justiça, assinado José Serra". Quaquaquá! Então eu vou fazer outro: "Mulher Melancia é a Justiça e a Verdade, assinado José Simão". Assinado na bunda dela!
O Pastor Serra vai lançar o Bolsa Dízimo! A Dilma entrou nessa também! Uma confusão. Um mente-desmente. Estão fazendo uma suruba religiosa! E o "Financial Times": "Candidatos no Brasil debatem aborto". Entre parênteses: "O aborto ainda é proibido no Brasil". Tem de explicar, senão os gringos selvagens e atrasados não entendem.
E olha o e-mail que recebi: "Dilma é a serva de Satã". Ah, o Lula mudou de nome? Agora então é: Vampiro de Cristo x Serva de Satã. Ganhe quem ganhar, o Brasil perdeu! E avisa pra eles que, se Deus fosse gay, o mundo seria mais arrumadinho. Rarará!
Aborto, homofobia! O próximo presidente do Brasil será o homem de Neandertal! Deus! Ó Deus! Adeus! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno! EU VOU VOTAR NO DIABO!
simao@uol.com.br
A questão do aborto
Descobri que eu amo Antonio Cicero. Ele escreve todo sábado na Folha de SP, meu jornal de cabeceira. No dia 16 de outubro, ele publicou a coluna que transcrevo abaixo. Meu voto? Por um país livre de uma campanha demagógica, viciada e interesseira. Hoje, dia de segundo turno, estou com preguiça de ser brasileira.
A questão do aborto
Quem se opõe à descriminalização do aborto defende não a vida, mas uma crença religiosa
Se não me engano, algum tempo atrás Lula previu que, nas eleições deste ano, todos os candidatos à Presidência seriam de esquerda. De fato, os três mais votados candidatos do primeiro turno, logo, os dois do segundo, são considerados de esquerda.
Serão mesmo? Pensaria o contrário quem, sem nada saber dos candidatos, visse as fotos diárias que a imprensa publica de cada um deles a assistir à missa; ou suas declarações de fé; ou suas confraternizações com pastores e políticos evangélicos; ou as promessas de obediência que fazem a líderes religiosos; ou suas renegações da proposta da descriminalização do aborto...
Dois dias atrás, afirmando que uma eleição é o pior momento para debater qualquer questão que seja, Contardo Calligaris postergou uma discussão sobre o aborto. Acho que ele estava certo. Contudo, tendo lido inúmeros ataques à tese de que o aborto deve ser descriminalizado, mas nenhum argumento a favor dela, resolvi lembrar aqui alguns que me parecem decisivos.
E, para mim, os argumentos mais decisivos são os do filósofo francês Francis Kaplan no seu livro "O Embrião É um Ser Vivo?", por ele resumidos em entrevista que a Folha publicou em abril de 2008.
Segundo Kaplan, deve-se distinguir entre "estar vivo" e "ser um ser vivo". Um ser vivo não é apenas um ser que tem funções (pois várias partes do ser vivo têm funções), mas um ser que tem todas as funções necessárias para estar vivo. Assim é um ser humano, por exemplo. Já o olho do ser humano, na medida em que lhe faculta enxergar, está vivo, mas não é um ser vivo. O olho está vivo somente na medida em que faz parte do ser vivo que é o ser humano.
Assim também o embrião está vivo somente enquanto parte de outro ser vivo, que é a sua mãe. Por si mesmo, "as funções vitais de que ele precisa para estar vivo são as da mãe. É graças à função digestiva da mãe que ele recebe o alimento, que pode usar somente por lhe chegar previamente digerido pela mãe; é graças à função glicogênica do fígado da mãe que ele recebe a glicose; é graças à função respiratória da mãe que os glóbulos vermelhos de seu sangue recebem o oxigênio; é graças à função excretória da mãe que ele expulsa materiais prejudiciais, dejetos que, de outro modo, o envenenariam".
E mais: "Não é o embrião que se desenvolve: é a mãe que, por meio da produção da serotonina periférica no sangue, determina, durante mais da metade da gestação, o desenvolvimento neurobiológico e a viabilidade futura do organismo que carrega".
Kaplan explica, ademais, que, pelo menos até o terceiro mês da concepção, o feto não tem atividade cerebral. Acontece que, como ele observa, "um homem sem atividade cerebral é considerado clinicamente morto". Ora, "o prazo de três meses é o prazo dentro do qual a maioria das mulheres que quer abortar aborta, mesmo que possam legalmente fazê-lo mais tarde".
Dito isso, vê-se que não é totalmente verdadeiro, como se supõe às vezes, que o embrião esteja para uma criança como uma semente para uma árvore ou um ovo para uma ave. Uma semente largada na terra pode tornar-se uma árvore; e um ovo pode, sendo incubado, tornar-se uma ave; um embrião, porém, não é capaz de se tornar uma criança fora do corpo da mãe.
Se, portanto, não se pode comparar a destruição de uma semente com a derrubada de uma árvore nem se pode comparar quebrar um ovo com matar uma ave, menos ainda se pode comparar o aborto, como querem alguns religiosos, com o assassinato de uma pessoa. Que pensar então da tese de que a vida da mãe não vale mais que a do feto?
Diga-se a verdade: quem se opõe à descriminalização do aborto defende não a vida, como alega, mas sim uma crença religiosa segundo a qual nem o prazer sexual pode ser um fim em si mesmo nem o ser humano é dono de si próprio ou do seu corpo.
Ora, cada qual tem o direito à crença religiosa que bem entender, mas o Estado, que deve ser laico, não pode adotar nenhuma delas em particular.
Nenhuma mulher recorre ao aborto por prazer, mas por sofrimento e para evitar ainda maior sofrimento para si, para sua família e para a criança que nasceria.
É uma grande crueldade que o Estado penalize ainda mais justamente as mulheres pobres que, sem recursos, são obrigadas a praticar o aborto nas piores condições imagináveis.
A questão do aborto
Quem se opõe à descriminalização do aborto defende não a vida, mas uma crença religiosa
Se não me engano, algum tempo atrás Lula previu que, nas eleições deste ano, todos os candidatos à Presidência seriam de esquerda. De fato, os três mais votados candidatos do primeiro turno, logo, os dois do segundo, são considerados de esquerda.
Serão mesmo? Pensaria o contrário quem, sem nada saber dos candidatos, visse as fotos diárias que a imprensa publica de cada um deles a assistir à missa; ou suas declarações de fé; ou suas confraternizações com pastores e políticos evangélicos; ou as promessas de obediência que fazem a líderes religiosos; ou suas renegações da proposta da descriminalização do aborto...
Dois dias atrás, afirmando que uma eleição é o pior momento para debater qualquer questão que seja, Contardo Calligaris postergou uma discussão sobre o aborto. Acho que ele estava certo. Contudo, tendo lido inúmeros ataques à tese de que o aborto deve ser descriminalizado, mas nenhum argumento a favor dela, resolvi lembrar aqui alguns que me parecem decisivos.
E, para mim, os argumentos mais decisivos são os do filósofo francês Francis Kaplan no seu livro "O Embrião É um Ser Vivo?", por ele resumidos em entrevista que a Folha publicou em abril de 2008.
Segundo Kaplan, deve-se distinguir entre "estar vivo" e "ser um ser vivo". Um ser vivo não é apenas um ser que tem funções (pois várias partes do ser vivo têm funções), mas um ser que tem todas as funções necessárias para estar vivo. Assim é um ser humano, por exemplo. Já o olho do ser humano, na medida em que lhe faculta enxergar, está vivo, mas não é um ser vivo. O olho está vivo somente na medida em que faz parte do ser vivo que é o ser humano.
Assim também o embrião está vivo somente enquanto parte de outro ser vivo, que é a sua mãe. Por si mesmo, "as funções vitais de que ele precisa para estar vivo são as da mãe. É graças à função digestiva da mãe que ele recebe o alimento, que pode usar somente por lhe chegar previamente digerido pela mãe; é graças à função glicogênica do fígado da mãe que ele recebe a glicose; é graças à função respiratória da mãe que os glóbulos vermelhos de seu sangue recebem o oxigênio; é graças à função excretória da mãe que ele expulsa materiais prejudiciais, dejetos que, de outro modo, o envenenariam".
E mais: "Não é o embrião que se desenvolve: é a mãe que, por meio da produção da serotonina periférica no sangue, determina, durante mais da metade da gestação, o desenvolvimento neurobiológico e a viabilidade futura do organismo que carrega".
Kaplan explica, ademais, que, pelo menos até o terceiro mês da concepção, o feto não tem atividade cerebral. Acontece que, como ele observa, "um homem sem atividade cerebral é considerado clinicamente morto". Ora, "o prazo de três meses é o prazo dentro do qual a maioria das mulheres que quer abortar aborta, mesmo que possam legalmente fazê-lo mais tarde".
Dito isso, vê-se que não é totalmente verdadeiro, como se supõe às vezes, que o embrião esteja para uma criança como uma semente para uma árvore ou um ovo para uma ave. Uma semente largada na terra pode tornar-se uma árvore; e um ovo pode, sendo incubado, tornar-se uma ave; um embrião, porém, não é capaz de se tornar uma criança fora do corpo da mãe.
Se, portanto, não se pode comparar a destruição de uma semente com a derrubada de uma árvore nem se pode comparar quebrar um ovo com matar uma ave, menos ainda se pode comparar o aborto, como querem alguns religiosos, com o assassinato de uma pessoa. Que pensar então da tese de que a vida da mãe não vale mais que a do feto?
Diga-se a verdade: quem se opõe à descriminalização do aborto defende não a vida, como alega, mas sim uma crença religiosa segundo a qual nem o prazer sexual pode ser um fim em si mesmo nem o ser humano é dono de si próprio ou do seu corpo.
Ora, cada qual tem o direito à crença religiosa que bem entender, mas o Estado, que deve ser laico, não pode adotar nenhuma delas em particular.
Nenhuma mulher recorre ao aborto por prazer, mas por sofrimento e para evitar ainda maior sofrimento para si, para sua família e para a criança que nasceria.
É uma grande crueldade que o Estado penalize ainda mais justamente as mulheres pobres que, sem recursos, são obrigadas a praticar o aborto nas piores condições imagináveis.
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
O primeiro dentinho do Artur
Eis que chegou outro dia das crianças, e eu mais uma vez me despenquei pro shopping, enfrentei filas e comprei o presente das minhas crianças e dos sobrinhos emprestados. Voltei para casa um pouco mais pobre, mas com um garotinho de 8 anos pululante, com todas as tranqueiras de futebol que ele bem quis (e que estavam previstas no orçamento materno).
O fim de semana foi prolongado para muitos, mas não para mim. Trabalhei hoje normalmente, e mais uma vez estou com centenas de aulas e de materiais a preparar. Tudo seria igual, se não fosse pelo presente mais lindo que eu poderia receber de surpresa: eu vi a pontinha do primeiro dentinho do Artur!!
Caro(a) leitor(a), não me chame levianamente de brega. Também se engana você, se me julga só porque não sou mãe de primeira viagem. O fato é que, quando o Johan era pequeno, todas as descobertas dele foram feitas ou por minha mãe ou pela bá. Com o Tutu já é diferente, parece que ele guarda para mim as surpresas, como se me presenteasse a cada momento em que estou em casa, vivendo com ele as experiências do dia a dia.
Enfim, o Tutu ganhou de presente, no seu primeiro 12 de outubro, um hipopótamo de banho, para alegrar ainda mais o momento mais divertido do seu dia. E eu ganhei a primeira mordida do meu filho, num beijo babado que, ainda de brinde, veio com uma gargalhadinha gostosa...
Desculpem-me o trocadilho, mas é o tipo da alegria que não tem preço...
O fim de semana foi prolongado para muitos, mas não para mim. Trabalhei hoje normalmente, e mais uma vez estou com centenas de aulas e de materiais a preparar. Tudo seria igual, se não fosse pelo presente mais lindo que eu poderia receber de surpresa: eu vi a pontinha do primeiro dentinho do Artur!!
Caro(a) leitor(a), não me chame levianamente de brega. Também se engana você, se me julga só porque não sou mãe de primeira viagem. O fato é que, quando o Johan era pequeno, todas as descobertas dele foram feitas ou por minha mãe ou pela bá. Com o Tutu já é diferente, parece que ele guarda para mim as surpresas, como se me presenteasse a cada momento em que estou em casa, vivendo com ele as experiências do dia a dia.
Enfim, o Tutu ganhou de presente, no seu primeiro 12 de outubro, um hipopótamo de banho, para alegrar ainda mais o momento mais divertido do seu dia. E eu ganhei a primeira mordida do meu filho, num beijo babado que, ainda de brinde, veio com uma gargalhadinha gostosa...
Desculpem-me o trocadilho, mas é o tipo da alegria que não tem preço...
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
Vontades do Dia
O que eu queria fazer hoje:
- ligar para uma pessoa com quem eu quisesse falar por horas e horas e horas
- fazer uma viagem para a Itália para comer (e ser comida), rezar e amar
- ver o Flamengo ganhar
- trocar de carro (ou ser a primeira a usar o teletransporte)
- comer brigadeiro quente sem culpa ou dor de barriga
- partir para uma viagem numa Harley, tipo Easy Rider
- colocar uma roupa vermelha bem bonita e sair para dançar
- tirar a roupa e sair para namorar
- estar na Lapa, no fervo do Rio de Janeiro
- estar num chalé a dois em Penedo
- não ter tanta prova para corrigir
- ter um chopp amigo para tomar
- tirar férias passageiras dos flhos
- sem querer, ganhar na Mega Sena
- dormir sem hora para acordar...
- ligar para uma pessoa com quem eu quisesse falar por horas e horas e horas
- fazer uma viagem para a Itália para comer (e ser comida), rezar e amar
- ver o Flamengo ganhar
- trocar de carro (ou ser a primeira a usar o teletransporte)
- comer brigadeiro quente sem culpa ou dor de barriga
- partir para uma viagem numa Harley, tipo Easy Rider
- colocar uma roupa vermelha bem bonita e sair para dançar
- tirar a roupa e sair para namorar
- estar na Lapa, no fervo do Rio de Janeiro
- estar num chalé a dois em Penedo
- não ter tanta prova para corrigir
- ter um chopp amigo para tomar
- tirar férias passageiras dos flhos
- sem querer, ganhar na Mega Sena
- dormir sem hora para acordar...
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Adeus, Socorro...
Na manhã de ontem, a minha querida Socorro virou um anjo e foi voar num céu azul cheio de passarinhos.
A Socorro foi fundamental na minha vida na época do meu mestrado. Ela e a dona Christa cuidavam de mim quando meus pais moravam em Araruama. A minha roupa estava sempre bem passada e perfumada; na hora do almoço, a Socorro sempre preparava um ovinho de gema dura, porque ela sempre soube que eu não como gema mole. O ovinho da Sô era perfeito, parecia até de enfeite, de tão bonito que era...
Outro dia, o Bruno, meu supercumpadre e amigo, me contou que a Socorro teve um avc. Levantou da cama e caiu em seguida. A mãe do Bruno, preocupada com o atraso, ligou para a casa dela, lá na Rocinha. A Socorro nunca tinha perdido a hora na vida. Quando conseguiu falar com a Letícia, a menina explicou que a mãe estava caída. A menina nem soube que a mãe já estava em estado semivegetativo no chão.
Todos estamos nos consolando, tentando acreditar que foi melhor para a Sô a partida. Nos últimos dias, estava no CTI do Miguel Couto, cheia de aparelhos. Se sobrevivesse, teria sequelas, provavelmente não poderia se alimentar mais, a não ser por sondas, e teria as duas pernas amputadas. Pelo menos partindo minha amiga pôde voar, protegendo a gente lá de cima.
Ficaram a Letícia e o Lucas, para a gente ajudar a cuidar. Tomara que um dia eu possa contar a eles que pessoa maravilhosa ela era, na sua presença mansa e constante.
E lá se foi de nós a Socorro, a única unanimidade inteligente que a gente conheceu.
...
A Socorro foi fundamental na minha vida na época do meu mestrado. Ela e a dona Christa cuidavam de mim quando meus pais moravam em Araruama. A minha roupa estava sempre bem passada e perfumada; na hora do almoço, a Socorro sempre preparava um ovinho de gema dura, porque ela sempre soube que eu não como gema mole. O ovinho da Sô era perfeito, parecia até de enfeite, de tão bonito que era...
Outro dia, o Bruno, meu supercumpadre e amigo, me contou que a Socorro teve um avc. Levantou da cama e caiu em seguida. A mãe do Bruno, preocupada com o atraso, ligou para a casa dela, lá na Rocinha. A Socorro nunca tinha perdido a hora na vida. Quando conseguiu falar com a Letícia, a menina explicou que a mãe estava caída. A menina nem soube que a mãe já estava em estado semivegetativo no chão.
Todos estamos nos consolando, tentando acreditar que foi melhor para a Sô a partida. Nos últimos dias, estava no CTI do Miguel Couto, cheia de aparelhos. Se sobrevivesse, teria sequelas, provavelmente não poderia se alimentar mais, a não ser por sondas, e teria as duas pernas amputadas. Pelo menos partindo minha amiga pôde voar, protegendo a gente lá de cima.
Ficaram a Letícia e o Lucas, para a gente ajudar a cuidar. Tomara que um dia eu possa contar a eles que pessoa maravilhosa ela era, na sua presença mansa e constante.
E lá se foi de nós a Socorro, a única unanimidade inteligente que a gente conheceu.
...
sábado, 18 de setembro de 2010
Mundo Cão
Agora aqui em casa a gente tem uma cachorrinha, a Pet, uma bassezinha simpática que adora roer Havaianas (as legítimas). Eu e Johan, juntos, já tivemos um prejuízo nos chinelos. Agora, por precaução, só usamos genéricos.
A Pet tem esse nome em homenagem ao Petcovitchi (rio de nome difícil, não sei se escrevi certo), do Flamengo. Ela veio parar aqui em casa por conta do aniversário do Johan, que estava reclamando de solidão na casa nova. Na verdade, meu filho liga para a filhote bem menos do que eu; eu descobri que nasci para ter cachorro. Adoro a bichinha. Nem me incomodo de lavar a varanda todo dia para limpar as caquinhas dela. Descobri nela um carinho daqueles sem limites... Sabe quando se tem certeza de que alguém nos ama de verdade? Pois é.
A minha amiga Vani também resolveu comprar uma cadelinha, uma Lhaza Apso muito fofa, a Wendy. A cachorrinha é uma graça, parece um bicho de pelúcia que vai na bolsa para tudo quanto é lugar. Para falar a verdade, a Wendy se comporta melhor do que muita gente em lugares públicos.
A Vani comprou caminha rosa, lacinho e todas essas bobeirinhas que a gente vê na rua e tem vontade de comprar mesmo. Pagou na cachorrinha 500 reais, mais do que ela pagaria em um fogão novo. Não importa, mais vale um amor do que dinheiro no bolso.
Estive pensando na matemática da Wendy e acho que a Vani fez bom negócio. Ela dorme com a Vani na mesma cama, mas não tem hora de ir embora no dia seguinte, igual ao namorado da minha amiga. Não tem os filhos que ele tem, nem duas ex-esposas que não largam do pé dele. Está sempre disponível no fim de semana (inclusive hoje, quando a cachorrinha saiu conosco e deu de cara com o namorado da minha amiga com a primeira ex e os filhos num carro que "não teria lugar para mais ninguém", é mole?). Está agora aqui com a gente, enquanto preparamos as coisas das nossas aulas, esperando quietinha pelo seu bifinho canino, o qual ela ganha toda vez que faz xixi no lugar certo (acho que o namorado da minha amiga nem xixi no lugar certo faz, e ainda deixa a tampa do vaso levantada).
Enfim, a Wendy é só lucro.
(E a Vani precisa trocar de namorado, urgente!!!!)
A Pet tem esse nome em homenagem ao Petcovitchi (rio de nome difícil, não sei se escrevi certo), do Flamengo. Ela veio parar aqui em casa por conta do aniversário do Johan, que estava reclamando de solidão na casa nova. Na verdade, meu filho liga para a filhote bem menos do que eu; eu descobri que nasci para ter cachorro. Adoro a bichinha. Nem me incomodo de lavar a varanda todo dia para limpar as caquinhas dela. Descobri nela um carinho daqueles sem limites... Sabe quando se tem certeza de que alguém nos ama de verdade? Pois é.
A minha amiga Vani também resolveu comprar uma cadelinha, uma Lhaza Apso muito fofa, a Wendy. A cachorrinha é uma graça, parece um bicho de pelúcia que vai na bolsa para tudo quanto é lugar. Para falar a verdade, a Wendy se comporta melhor do que muita gente em lugares públicos.
A Vani comprou caminha rosa, lacinho e todas essas bobeirinhas que a gente vê na rua e tem vontade de comprar mesmo. Pagou na cachorrinha 500 reais, mais do que ela pagaria em um fogão novo. Não importa, mais vale um amor do que dinheiro no bolso.
Estive pensando na matemática da Wendy e acho que a Vani fez bom negócio. Ela dorme com a Vani na mesma cama, mas não tem hora de ir embora no dia seguinte, igual ao namorado da minha amiga. Não tem os filhos que ele tem, nem duas ex-esposas que não largam do pé dele. Está sempre disponível no fim de semana (inclusive hoje, quando a cachorrinha saiu conosco e deu de cara com o namorado da minha amiga com a primeira ex e os filhos num carro que "não teria lugar para mais ninguém", é mole?). Está agora aqui com a gente, enquanto preparamos as coisas das nossas aulas, esperando quietinha pelo seu bifinho canino, o qual ela ganha toda vez que faz xixi no lugar certo (acho que o namorado da minha amiga nem xixi no lugar certo faz, e ainda deixa a tampa do vaso levantada).
Enfim, a Wendy é só lucro.
(E a Vani precisa trocar de namorado, urgente!!!!)
terça-feira, 24 de agosto de 2010
Resistência baixa
Ca-ra-ca, foi só escrever, pela manhã, que eu estava aqui, tentando dar conta dos doentes, que a coisa ficou mais frenética!!!
Agora, além do Rafa (A febre dele não abaixa!!!!) e da minha mãe (que não come mais, resolveu virar faquir!!!!), sou eu que estou baqueando. Já tive febre esta tarde, o que é RARÍSSIMO!!! Agora, meus olhos não param de arder e de lacrimejar...
Aos amigos blogueiros, que me acompanham à distância, já aviso que estou me desconectando temporariamente, até melhorar um pouco.
Rezas, mandigas e patuás são bem-vindos!!!
Agora, além do Rafa (A febre dele não abaixa!!!!) e da minha mãe (que não come mais, resolveu virar faquir!!!!), sou eu que estou baqueando. Já tive febre esta tarde, o que é RARÍSSIMO!!! Agora, meus olhos não param de arder e de lacrimejar...
Aos amigos blogueiros, que me acompanham à distância, já aviso que estou me desconectando temporariamente, até melhorar um pouco.
Rezas, mandigas e patuás são bem-vindos!!!
Pratos caindo no chão...
Na minha vida sempre foi assim: tudo acontece ao mesmo tempo agora.
Nesta semana, todo mundo resolveu ficar doente aqui em casa. Eu, com uma dor de garganta que nunca termina; minha mãe, que está dando defeito; o Rafa, com uma mega sinusite, com febrão desde sexta-feira e o Artur, coitado, que nunca fica bom da gripinha por causa desse tempo doido. Só sobrou o Johan, que já está reclamando de dor de ouvido também.
Para resumir, o Artur fica no meu colo o dia inteiro. Minha coluna foi pro espaço. O material das aulas e dos Congressos (ainda tem isso, participação em congresso e leituras pro Doutorado!!!!) eu preparo de madrugada. Às seis da manhã levanto para, nem contei aqui no blog ainda, tomar conta da cachorrinha Pet, a nova amiguinha do Johan.
Bem, agora posso dizer que a família (feliz) está completa: um casal, dois filhos, uma avó e um filhote. Que coisa mais família americana de subúrbio!!! rsrsrs
Percebi que não dá para equilibrar todos os pratos ao mesmo tempo. Assim, nos últimos dias, sacrifiquei meu trabalho para tentar recuperar minha voz e o fôlego. Nas próximas semanas, darei várias aulas extras nas faculs para repor minhas ausências. Onde eu pude, pedi aos amigos para repor minhas aulas. faço igual ao ditado: devo não nego, pago quando puder.
Campanha de presente de aniversário: Um dia no spa!!!
Nesta semana, todo mundo resolveu ficar doente aqui em casa. Eu, com uma dor de garganta que nunca termina; minha mãe, que está dando defeito; o Rafa, com uma mega sinusite, com febrão desde sexta-feira e o Artur, coitado, que nunca fica bom da gripinha por causa desse tempo doido. Só sobrou o Johan, que já está reclamando de dor de ouvido também.
Para resumir, o Artur fica no meu colo o dia inteiro. Minha coluna foi pro espaço. O material das aulas e dos Congressos (ainda tem isso, participação em congresso e leituras pro Doutorado!!!!) eu preparo de madrugada. Às seis da manhã levanto para, nem contei aqui no blog ainda, tomar conta da cachorrinha Pet, a nova amiguinha do Johan.
Bem, agora posso dizer que a família (feliz) está completa: um casal, dois filhos, uma avó e um filhote. Que coisa mais família americana de subúrbio!!! rsrsrs
Percebi que não dá para equilibrar todos os pratos ao mesmo tempo. Assim, nos últimos dias, sacrifiquei meu trabalho para tentar recuperar minha voz e o fôlego. Nas próximas semanas, darei várias aulas extras nas faculs para repor minhas ausências. Onde eu pude, pedi aos amigos para repor minhas aulas. faço igual ao ditado: devo não nego, pago quando puder.
Campanha de presente de aniversário: Um dia no spa!!!
terça-feira, 10 de agosto de 2010
O aniversário de Johan
Meu filho mais velho ontem fez 8 anos. Ganhou um playstation e muitas coisas do Flamengo. Teve festa na escola com bolo, refri, salgadinhos e muitos amigos, porque o Johan é um camarada muito popular. Sua festa seria numa pizzaria rodízio, mas não deu, porque não tinha espaço (nem grana da mãe) para chamar todo mundo.
Foi a primeira data em que eu reuni dois filhos numa festa de aniversário. O Artur foi prestigiar o irmão, mas não foi o protagonista desse momento. Acho que o Johan nem se deu conta, mas fazia muito tempo que ele não brilhava sozinho - desde que o irmão caçula nasceu, teve de aprender que coração de mãe se divide em quantos filhos tiver. E tem espaço para todo mundo.
Nas últimas férias de julho, tiramos uma noite para ir ao cimema. Vimos Toy Story 3 (que filme mais lindo!). Na hora em que o Andy foi doar os brinquedos para a garotinha, eu e Johan nos acabamos de chorar, e dividimos as mangas do seu casaco de moleton para enxugar nossas lágrimas. Compartilhamos também o embaraço de sairmos com a cara inchada e o nariz vermelho do cinema.
Aqui em casa, nem sempre eu tenho tempo de fazer o trabalho de casa junto, de dar banho, essas coisas, mas sempre que dá eu supervisiono as tarefas e dou faxina no ouvido e no umbigo. Tento compensar minha ausência lendo junto e colocando meu pequeno gigante para deitar. Quando a gente deita, é a maior farra, numa contação de história danada. Quase nunca a gente tem vontade de dormir, mas é preciso, né?
Meu último orgulho agora é que o Johan está aprendendo a ouvir as músicas de que gosto. Já sabe cantar "Eduardo e Mônica" e "Geração Coca-Cola" (esta ele até acha engraçada). Já apresentei para ele o Dire Straits, Engenheiros e Capital. Gostamos de cantar juntos, também, as músicas do Zeca Baleiro. Não se sabe quem é o pior inimigo do ritmo...
Vou sentir falta dos sete anos do Johan, mas estou adorando a fase dos oito também. Os tempos de hoje são bem diferentes daqueles do poeta (aquele do "Ai que saudade que tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida, dos tempos que não voltam mais"), mas ainda assim vai chegar uma época da gente dizer que "era feliz e não sabia".
Ainda bem que eu ainda tenho o Artur para me presentear com todas essas delícias de novo...
Foi a primeira data em que eu reuni dois filhos numa festa de aniversário. O Artur foi prestigiar o irmão, mas não foi o protagonista desse momento. Acho que o Johan nem se deu conta, mas fazia muito tempo que ele não brilhava sozinho - desde que o irmão caçula nasceu, teve de aprender que coração de mãe se divide em quantos filhos tiver. E tem espaço para todo mundo.
Nas últimas férias de julho, tiramos uma noite para ir ao cimema. Vimos Toy Story 3 (que filme mais lindo!). Na hora em que o Andy foi doar os brinquedos para a garotinha, eu e Johan nos acabamos de chorar, e dividimos as mangas do seu casaco de moleton para enxugar nossas lágrimas. Compartilhamos também o embaraço de sairmos com a cara inchada e o nariz vermelho do cinema.
Aqui em casa, nem sempre eu tenho tempo de fazer o trabalho de casa junto, de dar banho, essas coisas, mas sempre que dá eu supervisiono as tarefas e dou faxina no ouvido e no umbigo. Tento compensar minha ausência lendo junto e colocando meu pequeno gigante para deitar. Quando a gente deita, é a maior farra, numa contação de história danada. Quase nunca a gente tem vontade de dormir, mas é preciso, né?
Meu último orgulho agora é que o Johan está aprendendo a ouvir as músicas de que gosto. Já sabe cantar "Eduardo e Mônica" e "Geração Coca-Cola" (esta ele até acha engraçada). Já apresentei para ele o Dire Straits, Engenheiros e Capital. Gostamos de cantar juntos, também, as músicas do Zeca Baleiro. Não se sabe quem é o pior inimigo do ritmo...
Vou sentir falta dos sete anos do Johan, mas estou adorando a fase dos oito também. Os tempos de hoje são bem diferentes daqueles do poeta (aquele do "Ai que saudade que tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida, dos tempos que não voltam mais"), mas ainda assim vai chegar uma época da gente dizer que "era feliz e não sabia".
Ainda bem que eu ainda tenho o Artur para me presentear com todas essas delícias de novo...
quinta-feira, 5 de agosto de 2010
Retratos na parede
Mexendo numas coisas, achei rastros de uma Ana que há muito tempo eu não via.
São textos, fotos, cheiros, enfim, coisas que fizeram parte de um momento da minha vida que não existe mais.
Uma veia aberta que pulsa em mim esquecida.
Engraçado como a gente envelhece e vai achando que a vida é como um filme.
Tem coisa que parece que não é a gente, mas personagem de cinema.
Tem amigo que virou figurante.
Tem cenário de novela de Manuel Carlos.
Tem diálogos que a gente não consegue esquecer,
tem outros que a gente não consegue lembrar.
Às vezes, eu queria ter 17 e viver tudo de novo.
às vezes eu queria vestir fantasia e ver o mundo de fora.
quase sempre eu queria ter dito ao meu pai que ele estava certo.
Minha vida se tornou um retrato de parede que ainda dói.
E o pior é que nem sempre me reconheço no retrato...
OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO (DRUMMOND)
Os ombros que suportam o mundo
Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertam ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertam ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
DA CHEGADA DO AMOR (Elisa Lucinda)
Sempre quis um amor
que falasse
que soubesse o que sentisse.
Sempre quis uma amor que elaborasse
Que quando dormisse
ressonasse confiança
no sopro do sono
e trouxesse beijo
no clarão da amanhecice.
Sempre quis um amor
que coubesse no que me disse.
Sempre quis uma meninice
entre menino e senhor
uma cachorrice
onde tanto pudesse a sem-vergonhice
do macho
quanto a sabedoria do sabedor.
Sempre quis um amor cujo
BOM DIA!
morasse na eternidade de encadear os tempos:
passado presente futuro
coisa da mesma embocadura
sabor da mesma golada.
Sempre quis um amor de goleadas
cuja rede complexa
do pano de fundo dos seres
não assustasse.
Sempre quis um amor
que não se incomodasse
quando a poesia da cama me levasse.
Sempre quis uma amor
que não se chateasse
diante das diferenças.
Agora, diante da encomenda
metade de mim rasga afoita
o embrulho
e a outra metade é o
futuro de saber o segredo
que enrola o laço,
é observar
o desenho
do invólucro e compará-lo
com a calma da alma
o seu conteúdo.
Contudo
sempre quis um amor
que me coubesse futuro
e me alternasse em menina e adulto
que ora eu fosse o fácil, o sério
e ora um doce mistério
que ora eu fosse medo-asneira
e ora eu fosse brincadeira
ultra-sonografia do furor,
sempre quis um amor
que sem tensa-corrida-de ocorresse.
Sempre quis um amor
que acontecesse
sem esforço
sem medo da inspiração
por ele acabar.
Sempre quis um amor
de abafar,
(não o caso)
mas cuja demora de ocaso
estivesse imensamente
nas nossas mãos.
Sem senãos.
Sempre quis um amor
com definição de quero
sem o lero-lero da falsa sedução.
Eu sempre disse não
à constituição dos séculos
que diz que o "garantido" amor
é a sua negação.
Sempre quis um amor
que gozasse
e que pouco antes
de chegar a esse céu
se anunciasse.
Sempre quis um amor
que vivesse a felicidade
sem reclamar dela ou disso.
Sempre quis um amor não omisso
e que suas estórias me contasse.
Ah, eu sempre quis uma amor que amasse.
Poesia extraída do livro "Euteamo e suas estréias", Editora Record - Rio de Janeiro, 1999,
que falasse
que soubesse o que sentisse.
Sempre quis uma amor que elaborasse
Que quando dormisse
ressonasse confiança
no sopro do sono
e trouxesse beijo
no clarão da amanhecice.
Sempre quis um amor
que coubesse no que me disse.
Sempre quis uma meninice
entre menino e senhor
uma cachorrice
onde tanto pudesse a sem-vergonhice
do macho
quanto a sabedoria do sabedor.
Sempre quis um amor cujo
BOM DIA!
morasse na eternidade de encadear os tempos:
passado presente futuro
coisa da mesma embocadura
sabor da mesma golada.
Sempre quis um amor de goleadas
cuja rede complexa
do pano de fundo dos seres
não assustasse.
Sempre quis um amor
que não se incomodasse
quando a poesia da cama me levasse.
Sempre quis uma amor
que não se chateasse
diante das diferenças.
Agora, diante da encomenda
metade de mim rasga afoita
o embrulho
e a outra metade é o
futuro de saber o segredo
que enrola o laço,
é observar
o desenho
do invólucro e compará-lo
com a calma da alma
o seu conteúdo.
Contudo
sempre quis um amor
que me coubesse futuro
e me alternasse em menina e adulto
que ora eu fosse o fácil, o sério
e ora um doce mistério
que ora eu fosse medo-asneira
e ora eu fosse brincadeira
ultra-sonografia do furor,
sempre quis um amor
que sem tensa-corrida-de ocorresse.
Sempre quis um amor
que acontecesse
sem esforço
sem medo da inspiração
por ele acabar.
Sempre quis um amor
de abafar,
(não o caso)
mas cuja demora de ocaso
estivesse imensamente
nas nossas mãos.
Sem senãos.
Sempre quis um amor
com definição de quero
sem o lero-lero da falsa sedução.
Eu sempre disse não
à constituição dos séculos
que diz que o "garantido" amor
é a sua negação.
Sempre quis um amor
que gozasse
e que pouco antes
de chegar a esse céu
se anunciasse.
Sempre quis um amor
que vivesse a felicidade
sem reclamar dela ou disso.
Sempre quis um amor não omisso
e que suas estórias me contasse.
Ah, eu sempre quis uma amor que amasse.
Poesia extraída do livro "Euteamo e suas estréias", Editora Record - Rio de Janeiro, 1999,
Amor Feinho (Adelia Prado)
Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado, é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte, o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado, é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte, o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero amor feinho.
sábado, 31 de julho de 2010
Pérolas de Johan II
Eu e Johan em casa, sexta-feira à noite, lendo Os Lusíadas em quadrinhos.
Eu, toda boba, explico a ele de que trata o livro, conto para ele quem é Camões, falo da viagem da Vasco da Gama...
Na explicação, eu digo:
- A primeira publicação de Os Lusíadas foi de 1572. Os portugueses estavam procurando o caminho das Índias...
- Por quê, mãe, eles queriam ver a novela?...
Sem comentários...
Eu, toda boba, explico a ele de que trata o livro, conto para ele quem é Camões, falo da viagem da Vasco da Gama...
Na explicação, eu digo:
- A primeira publicação de Os Lusíadas foi de 1572. Os portugueses estavam procurando o caminho das Índias...
- Por quê, mãe, eles queriam ver a novela?...
Sem comentários...
Pérolas de Johan
terça-feira, 27 de julho de 2010
DE MÃE PRA MÃES
Minha amiga Candida é uma mulher admirável. Ela pinta, borda, costura e cuida dos filhos como ninguém.Um dia, quando eu crescer, quero ser igual a ela: bacanérrima, com uma casa linda, que a gente não tem vontade de ir embora nunca. Tem quatro filhos lindos e maravilhosos: Lis, Pedro, Hugo e Artur (este último me inspirou na escolha do nome do meu caçula). Foi a Can que me ensinou que mulher quer, no fundo, poder ser Amélia, para só ficar em casa com os filhos, com a casa e com um amor (e eu demorei muito tempo para aprender isso). Quando meu pai morreu, ela se despencou de BH e deixou tudo para trás, só para me dar colo por uma noite. Amiga, irmã, mãezona, a Can se tornou minha amiga de infância numa noite, quando não dormimos só para contar uma para a outra tudo o que a vida nos ensinou. E olha que isso foi no primeiro dia em que a gente se viu, numa espécie de "amor de amigo à primeira vista".
Hoje, quando eu abri seu blog, eu vi esse post. Chorei muito quando li, por motivos óbvios. É que a minha amiga-maravilha, além de tudo o que eu já falei, é mãe de dois skatistas, dois meninos alados que voam nas noites de Belo Horizonte, procurando superar seus limites e seus recordes...
Dedico hoje o meu post a Can, e às mães de outros meninos voadores que insistiram em nos deixar mais cedo...
DE MÃE PRA MÃES (Candida Najar)
Não há como negar que em coração de mãe cabe um mundo inteiro, mas não tem nenhum canto - e nem terá nunca - que caiba compreender e aceitar morte de filho. Essa possibilidade não deveria existir se tudo fosse tão perfeito quanto gostaríamos. Deus falhou aí, deixando margem pra que uma ruindade tão grande acontecesse a tantas mulheres neste vasto mundão.
Um anjo skatista deu de partir cedo demais. Chorei até desidratar e perder a voz, porque me coloco no lugar da mãe dele e não consigo acreditar que ele 'tava lá, fazendo uma coisa tão bacana, voando no chão, e vem alguém pra acabar com a alegria do menino, da mãe do menino, do pai do menino, dos amigos do menino, de tantos meninos e tantas mães dos meninos que só querem sentir o vento na cara, testar o equilíbrio em cima daquela prancha de madeira, ralar os cotovelos e joelhos pra, quando chegarem em casa esfolados, a mãe assoprar e fazer curativos. Se for muito grave os amigos já ligam do hospital pra mãe ir lá ver o médico colocar ombro no lugar, engessar braços e mãos, marcar cirurgia pra remendar o que quebrou na última queda...
Cada um precisa ter mãe pra dar apoio quando é machucado às vésperas de uma competição e, claro, não consegue lidar com a frustração sozinho. Aí aparece um colo quentinho pra acolher, mãos protetoras pra fazer um chá e tempo disponível pra assistir juntos filmes "nada a ver", mas cada etapa destas faz parte do apoio moral pro anjo melhorar.
Cada uma de nós precisa tê-los pra saber a delícia que é o amor incondicional, infinito, sem ressalvas - apesar dos sobressaltos.
Ver nossos meninos detonados e cuidar deles é o máximo que uma mãe pode suportar.
Despedir pra sempre nunca.
Mas às vezes é preciso nadar contra a correnteza, buscar forças sabe-se lá de onde pra agradecer o tempo que nos é dado na convivência com nossos filhos. A alegria que vivemos com eles ninguém nem nada poderá nunca apagar, nem comparar, nem esquecer.
Que sua mãe seja abençoada com a força e a coragem de todas as mães, Rafael. E que o amor dela por você seja a mola propulsora pra que a saudade seja menos doída com o passar do tempo. Toque canções de ninar pra ela, ainda que em sonho. Agora ela é quem tá precisando de colo e chá quente, de quem assopre a ferida que sua partida deixou.
Vá em paz, anjo skatista! Fique em paz, mãe do menino voador...
Hoje, quando eu abri seu blog, eu vi esse post. Chorei muito quando li, por motivos óbvios. É que a minha amiga-maravilha, além de tudo o que eu já falei, é mãe de dois skatistas, dois meninos alados que voam nas noites de Belo Horizonte, procurando superar seus limites e seus recordes...
Dedico hoje o meu post a Can, e às mães de outros meninos voadores que insistiram em nos deixar mais cedo...
DE MÃE PRA MÃES (Candida Najar)
Não há como negar que em coração de mãe cabe um mundo inteiro, mas não tem nenhum canto - e nem terá nunca - que caiba compreender e aceitar morte de filho. Essa possibilidade não deveria existir se tudo fosse tão perfeito quanto gostaríamos. Deus falhou aí, deixando margem pra que uma ruindade tão grande acontecesse a tantas mulheres neste vasto mundão.
Um anjo skatista deu de partir cedo demais. Chorei até desidratar e perder a voz, porque me coloco no lugar da mãe dele e não consigo acreditar que ele 'tava lá, fazendo uma coisa tão bacana, voando no chão, e vem alguém pra acabar com a alegria do menino, da mãe do menino, do pai do menino, dos amigos do menino, de tantos meninos e tantas mães dos meninos que só querem sentir o vento na cara, testar o equilíbrio em cima daquela prancha de madeira, ralar os cotovelos e joelhos pra, quando chegarem em casa esfolados, a mãe assoprar e fazer curativos. Se for muito grave os amigos já ligam do hospital pra mãe ir lá ver o médico colocar ombro no lugar, engessar braços e mãos, marcar cirurgia pra remendar o que quebrou na última queda...
Cada um precisa ter mãe pra dar apoio quando é machucado às vésperas de uma competição e, claro, não consegue lidar com a frustração sozinho. Aí aparece um colo quentinho pra acolher, mãos protetoras pra fazer um chá e tempo disponível pra assistir juntos filmes "nada a ver", mas cada etapa destas faz parte do apoio moral pro anjo melhorar.
Cada uma de nós precisa tê-los pra saber a delícia que é o amor incondicional, infinito, sem ressalvas - apesar dos sobressaltos.
Ver nossos meninos detonados e cuidar deles é o máximo que uma mãe pode suportar.
Despedir pra sempre nunca.
Mas às vezes é preciso nadar contra a correnteza, buscar forças sabe-se lá de onde pra agradecer o tempo que nos é dado na convivência com nossos filhos. A alegria que vivemos com eles ninguém nem nada poderá nunca apagar, nem comparar, nem esquecer.
Que sua mãe seja abençoada com a força e a coragem de todas as mães, Rafael. E que o amor dela por você seja a mola propulsora pra que a saudade seja menos doída com o passar do tempo. Toque canções de ninar pra ela, ainda que em sonho. Agora ela é quem tá precisando de colo e chá quente, de quem assopre a ferida que sua partida deixou.
Vá em paz, anjo skatista! Fique em paz, mãe do menino voador...
quinta-feira, 22 de julho de 2010
Meus pratinhos...
Que eu sou equilibradora de pratos quem convive comigo já sabe, mas sempre tem um pratinho ou outro que a gente deixa cair no chão. Por exemplo, esta semana eu chutei a dieta, na ansiedade de dar conta logo dos artigos que tenho de entregar até o fim das férias. Não dei conta também das coisas chatas de Detran, de médico, de eletricista, nada disso. Aproveitei o máximo meu tempo com minha família e amigos, na expectativa de recarregar minhas baterias.
Na foto, os meus meninos... meus pratinhos que eu equilibro com tanto carinho... Posso deixar cair os outros, estes eu seguro bem pertinho de mim...
Auto-retrato do Artista aos 56 anos
Eu sou fã de Graciliano Ramos. Um dos textos dele que eu adoro trabalhar com meus alunos é esse "Auto-retrato". Acho que ele tem identidade, e procuro ensinar isso às minhas turmas: nossas escolhas nos definem e dizem quem somos... Para provocar, segue abaixo, antes da pequena autobiografia, um pequeno pensamento disponível no site oficial do poeta.
"Começamos oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas
com a Delegacia de Ordem Política e Social, mas, nos
estreitos limites a que nos coagem a gramática e a lei,
ainda nos podemos mexer"
Auto-Retrato do Artista aos 56 anos
Nasceu em 1892, em Quebrangulo [paroxítono], Alagoas. Casado duas vezes, tem sete filhos. Altura, 1,75. Sapato n.º 41. Colarinho n.º 39. Prefere não andar. Não gosta de vizinhos. Detesta rádio, telefone e campainhas. Tem horror às pessoas que falam alto. Usa óculos. Meio calvo. Não tem preferência por nenhuma comida. Indiferente à música. Não gosta de frutas nem de doces. Sua leitura predileta: a Bíblia. Escreve Caetés com 34 anos de idade. Não dá preferência a nenhum dos seus livros publicados. Gosta de beber aguardente. É ateu. Indiferente à Academia. Odeia a burguesia. Adora crianças. Romancistas brasileiros que mais lhe agradam: Manoel António de Almeida, Machado de Assis, Jorge Amado, José Lins do Rego e Rachel de Queiroz. Gosta de palavrões escritos e falados. Deseja a morte do capitalismo. Escreve seus livros pela manhã. Fuma cigarros Selma (três maços por dia). É inspetor de ensino, trabalha no Correio da Manhã. Apesar de o acharem pessimista, discorda de tudo. Só tem cinco ternos de roupa, estragados. Refaz seus romances várias vezes. Esteve preso duas vezes. É-lhe indiferente estar preso ou solto. Escreve à mão. Seus maiores amigos: Capitão Lobo, Cubano, José Lins do Rego e José Olympio. Tem poucas dívidas. Quando prefeito de uma cidade do interior, soltava os presos para construírem estradas. Espera morrer com 57 anos.
Notas:Capitão Lobo comandava o quartel em que esteve preso no Recife, 1936; Cubano foi um ladrão que ele conheceu na cadeia. (Ver Memórias do Cárcere, título idêntico ao de Camillo Castello Branco). Graciliano Ramos morreu aos 61 anos de idade.
"Começamos oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas
com a Delegacia de Ordem Política e Social, mas, nos
estreitos limites a que nos coagem a gramática e a lei,
ainda nos podemos mexer"
Auto-Retrato do Artista aos 56 anos
Nasceu em 1892, em Quebrangulo [paroxítono], Alagoas. Casado duas vezes, tem sete filhos. Altura, 1,75. Sapato n.º 41. Colarinho n.º 39. Prefere não andar. Não gosta de vizinhos. Detesta rádio, telefone e campainhas. Tem horror às pessoas que falam alto. Usa óculos. Meio calvo. Não tem preferência por nenhuma comida. Indiferente à música. Não gosta de frutas nem de doces. Sua leitura predileta: a Bíblia. Escreve Caetés com 34 anos de idade. Não dá preferência a nenhum dos seus livros publicados. Gosta de beber aguardente. É ateu. Indiferente à Academia. Odeia a burguesia. Adora crianças. Romancistas brasileiros que mais lhe agradam: Manoel António de Almeida, Machado de Assis, Jorge Amado, José Lins do Rego e Rachel de Queiroz. Gosta de palavrões escritos e falados. Deseja a morte do capitalismo. Escreve seus livros pela manhã. Fuma cigarros Selma (três maços por dia). É inspetor de ensino, trabalha no Correio da Manhã. Apesar de o acharem pessimista, discorda de tudo. Só tem cinco ternos de roupa, estragados. Refaz seus romances várias vezes. Esteve preso duas vezes. É-lhe indiferente estar preso ou solto. Escreve à mão. Seus maiores amigos: Capitão Lobo, Cubano, José Lins do Rego e José Olympio. Tem poucas dívidas. Quando prefeito de uma cidade do interior, soltava os presos para construírem estradas. Espera morrer com 57 anos.
Notas:Capitão Lobo comandava o quartel em que esteve preso no Recife, 1936; Cubano foi um ladrão que ele conheceu na cadeia. (Ver Memórias do Cárcere, título idêntico ao de Camillo Castello Branco). Graciliano Ramos morreu aos 61 anos de idade.
domingo, 18 de julho de 2010
Medo
Raymond Carver (1938-88), escritor e poeta americano, publicou em 1981, entre outros, a coletânea de contos "Iniciantes" ("What we talk about when we talk about Love", trad. Rubens Figueiredo, Companhia das Letras). A Ilustríssima, da Folha de São Paulo, troxe na data de hoje umas coisas bacanérrimas que ele escreveu. Eu me identifiquei com o poema Medo. Se você gostar, vá em http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/768049-quatro-poemas-de-raymond-carver.shtml
Medo
Medo de ver a polícia estacionar à minha porta.
Medo de dormir à noite.
Medo de não dormir.
Medo de que o passado desperte.
Medo de que o presente alce voo.
Medo do telefone que toca no silêncio da noite.
Medo de tempestades fulminantes.
Medo da faxineira que tem uma pinta no queixo!
Medo de cães que supostamente não mordem.
Medo da ansiedade!
Medo de ter que identificar o corpo de um amigo morto.
Medo de ficar sem dinheiro.
Medo de ter demais, mesmo que ninguém vá acreditar nisso.
Medo de perfis psicológicos.
Medo de me atrasar e medo de ser o primeiro a chegar.
Medo de ver a letra dos meus filhos em envelopes.
Medo de que eles morram antes de mim, e que eu me sinta culpado.
Medo de ter que viver com minha mãe em sua velhice, e na minha.
Medo da confusão.
Medo de que esse dia acabe em um bilhete infeliz.
Medo de acordar e ver que você partiu.
Medo de não amar e medo de não amar o bastante.
Medo de que o que amo se prove letal para aqueles que amo.
Medo da morte.
Medo de viver demais.
Medo da morte.
Já disse isso.
Medo
Medo de ver a polícia estacionar à minha porta.
Medo de dormir à noite.
Medo de não dormir.
Medo de que o passado desperte.
Medo de que o presente alce voo.
Medo do telefone que toca no silêncio da noite.
Medo de tempestades fulminantes.
Medo da faxineira que tem uma pinta no queixo!
Medo de cães que supostamente não mordem.
Medo da ansiedade!
Medo de ter que identificar o corpo de um amigo morto.
Medo de ficar sem dinheiro.
Medo de ter demais, mesmo que ninguém vá acreditar nisso.
Medo de perfis psicológicos.
Medo de me atrasar e medo de ser o primeiro a chegar.
Medo de ver a letra dos meus filhos em envelopes.
Medo de que eles morram antes de mim, e que eu me sinta culpado.
Medo de ter que viver com minha mãe em sua velhice, e na minha.
Medo da confusão.
Medo de que esse dia acabe em um bilhete infeliz.
Medo de acordar e ver que você partiu.
Medo de não amar e medo de não amar o bastante.
Medo de que o que amo se prove letal para aqueles que amo.
Medo da morte.
Medo de viver demais.
Medo da morte.
Já disse isso.
Sentimento do Mundo
Vejo a foto do menino sendo dilacerado pela mãe, em Veja, e penso no que o fanatismo religioso é capaz de realizar pelo mundo. Sinto uma dor de angústia, alimentada por uma enorme sensação de passividade (por que não dizer nulidade?) frente a tudo que me incomoda. Longe o menino chora, em outra cidade talvez, talvez em outro mundo.
Vou dormir. Não durmo. Acendo a luz. Faz frio. Leio. Lá fora vejo a chuva caindo e os carros passando na rua. Do meu apartamento, no térreo, vejo também pessoas, coadjuvantes diárias do meu filme. Sempre que posso, de propósito, faço a mesma coisa: acendo a luz do abajur, sento no sofá da sala e me escondo por trás das cortinas, mas sempre deixando frestas. Enquanto quem está do lado de fora não me vê, transformo as pessoas em companheiras mudas da minha solidão. Uso as pessoas para não me reconhecer sozinha. Talvez o mundo não tenha jeito e os suicidas tenham razão.
Drummond. Como nunca sei o que ler de Drummond, pego sempre a mesma capa verde, papel que imita folhas da bíblia, coleção da Aguillar. Drummond é a minha bíblia. Panegírico das horas insones. Mas a recorrência da foto do menino é mais forte. A imagem não me sai da cabeça. Nem a poesia conseguiu me sedar nesse momento de vaivéns. Meu Deus, por que me abandonaste?
E comecei a refletir sobre as imagens que me vinham à memória. Longe o menino chora... Será que longe? Da minha fresta vejo uma família vagando nas ruas: pai, mãe, dois filhos, um deles bebê. É madrugada, faz frio... O menino do outro lado do mundo chora e olha em meus olhos. Aquela família também chora, mas um choro silencioso, resignado, esquecido. Senti culpa. Culpa por me indignar com a foto do outro lado do mundo e culpa por não me importar com a dor e o sofrimento que até hoje bateram à minha porta. No fundo, quem chora aqui sou eu.
Continuo com os meus olhos fixos na janela a ver a imagem da dilaceração do ser humano na minha frente. A família foi embora. Do outro lado da rua, um chafariz iluminado, colorido. A imagem é bonita, poética, mas talvez nem a poesia me valha em tempos de indulgência. Flores amarelas e medrosas ainda nascem na minha janela.
Vou dormir. Não durmo. Acendo a luz. Faz frio. Leio. Lá fora vejo a chuva caindo e os carros passando na rua. Do meu apartamento, no térreo, vejo também pessoas, coadjuvantes diárias do meu filme. Sempre que posso, de propósito, faço a mesma coisa: acendo a luz do abajur, sento no sofá da sala e me escondo por trás das cortinas, mas sempre deixando frestas. Enquanto quem está do lado de fora não me vê, transformo as pessoas em companheiras mudas da minha solidão. Uso as pessoas para não me reconhecer sozinha. Talvez o mundo não tenha jeito e os suicidas tenham razão.
Drummond. Como nunca sei o que ler de Drummond, pego sempre a mesma capa verde, papel que imita folhas da bíblia, coleção da Aguillar. Drummond é a minha bíblia. Panegírico das horas insones. Mas a recorrência da foto do menino é mais forte. A imagem não me sai da cabeça. Nem a poesia conseguiu me sedar nesse momento de vaivéns. Meu Deus, por que me abandonaste?
E comecei a refletir sobre as imagens que me vinham à memória. Longe o menino chora... Será que longe? Da minha fresta vejo uma família vagando nas ruas: pai, mãe, dois filhos, um deles bebê. É madrugada, faz frio... O menino do outro lado do mundo chora e olha em meus olhos. Aquela família também chora, mas um choro silencioso, resignado, esquecido. Senti culpa. Culpa por me indignar com a foto do outro lado do mundo e culpa por não me importar com a dor e o sofrimento que até hoje bateram à minha porta. No fundo, quem chora aqui sou eu.
Continuo com os meus olhos fixos na janela a ver a imagem da dilaceração do ser humano na minha frente. A família foi embora. Do outro lado da rua, um chafariz iluminado, colorido. A imagem é bonita, poética, mas talvez nem a poesia me valha em tempos de indulgência. Flores amarelas e medrosas ainda nascem na minha janela.
terça-feira, 13 de julho de 2010
Crime e Castigo
de Lya Luft
Tomo emprestado o título do romance do russo Dostoiévski, para comentar a multiplicação dos crimes nesta cultura torta, desde os pequenos "crimes" cotidianos – falta de respeito entre pais e filhos, maus-tratos a empregados, comportamento impensável de políticos e líderes, descuido com nossa saúde, segurança, educação – até os verdadeiros crimes: roubos, assaltos, assassinatos, tão incrivelmente banalizados nesta sociedade enferma. A crise de autoridade começa em casa, quando temos medo de dar ordens e limites ou mesmo castigos aos filhos, iludidos por uma série de psicologismos falsos que pululam como receitas de revista ou programa matinal de televisão e que também invadiram parte das escolas. Crianças e adolescentes saudáveis são tratados a mamadeira e cachorro-quente por pais desorientados e receosos de exercer qualquer comando. Jovens infratores são tratados como imbecis, embora espertos, e como inocentes, mesmo que perversos estupradores, frios assassinos, traficantes e ladrões comuns. São encaminhados para os chamados centros de ressocialização, onde nada aprendem de bom, mas muito de ruim, e logo voltam às ruas para continuar seus crimes.
Estamos levando na brincadeira a questão do erro e do castigo, ou do crime e da punição. A banalização da má-educação em casa e na escola, e do crime fora delas, é espantosa e tem consequências dramáticas que hoje não conseguimos mais avaliar. Sem limites em casa e sem punição de crimes fora dela, nada vai melhorar. Antes de mais nada, é dever mudar as leis – e não é possível que não se possa mudar uma lei, duas leis, muitas leis. Hoje, logo, agora! O ensino nas últimas décadas foi piorando, em parte pelo desinteresse dos governos e pelo péssimo incentivo aos professores, que ganham menos do que uma empregada doméstica, em parte como resultado de "diretrizes de ensino" que tornaram tudo confuso, experimental, com alunos servindo de cobaias, professores lotados de teorias (que também não funcionam). Além disso, aqui e ali grupos de ditos mestres passaram a se interessar mais por politicagem e ideologia do que pelo bem dos alunos e da própria classe. Não admira que em alguns lugares o respeito tenha sumido, os alunos considerem com desdém ou indignação a figura do antigo mestre e ainda por cima vivam, em muitas famílias, a dor da falta de pais: em lugar deles, como disse um jovem psicólogo, eles têm em casa um gatão e uma gatinha. Dispensam-se comentários.
Autoridade, onde existe, é considerada atrasada, antiquada e chata. Se nas famílias e escolas isso é um problema, na sociedade, com nossas leis falhas, sem rigor nem coerência, isso se torna uma tragédia. Não me falem em policiais corruptos, pois a maioria imensa deles é honrada, ganha vergonhosamente pouco, arrisca e perde a vida, e pouco ligamos para isso. Eu penso em leis ruins e em prisões lotadas de gente em condições animalescas. Nesta nossa cultura do absurdo, crimes pequenos levam seus autores a passar anos num desses lixões de gente chamados cadeias (muitas vezes sem sequer ter havido ainda julgamento e condenação), enquanto bandidos perigosos entram por uma porta de cadeia e saem pela outra, para voltar a cometer seus crimes, ou gozam na cadeia de um conforto que nem avaliamos.
Precisamos de punições justas, autoridade vigilante, uma reforma geral das leis para impedir perversidade ou leniência, jovens criminosos julgados como criminosos, não como crianças malcriadas. Ensino, educação e justiça tornaram-se tão ruins, tudo isso agravado pelo delírio das drogas fomentado por traficantes ou por irresponsáveis que as usam como diversão ou alívio momentâneo, que passamos a aceitar tudo como normal: "É assim mesmo". Muito crime, pouco castigo, castigo excessivo ou brando demais, leis antiquadas ou insuficientes, e chegamos aonde chegamos: os cidadãos reféns dentro de casa ou ratos assustados nas ruas, a bandidagem no controle; pais com medo dos filhos, professores insultados pela meninada sem educação. Seria de rir, se não fosse de chorar.
(In: Revista Veja. Lya Luft. 25/07/2009)
Tomo emprestado o título do romance do russo Dostoiévski, para comentar a multiplicação dos crimes nesta cultura torta, desde os pequenos "crimes" cotidianos – falta de respeito entre pais e filhos, maus-tratos a empregados, comportamento impensável de políticos e líderes, descuido com nossa saúde, segurança, educação – até os verdadeiros crimes: roubos, assaltos, assassinatos, tão incrivelmente banalizados nesta sociedade enferma. A crise de autoridade começa em casa, quando temos medo de dar ordens e limites ou mesmo castigos aos filhos, iludidos por uma série de psicologismos falsos que pululam como receitas de revista ou programa matinal de televisão e que também invadiram parte das escolas. Crianças e adolescentes saudáveis são tratados a mamadeira e cachorro-quente por pais desorientados e receosos de exercer qualquer comando. Jovens infratores são tratados como imbecis, embora espertos, e como inocentes, mesmo que perversos estupradores, frios assassinos, traficantes e ladrões comuns. São encaminhados para os chamados centros de ressocialização, onde nada aprendem de bom, mas muito de ruim, e logo voltam às ruas para continuar seus crimes.
Estamos levando na brincadeira a questão do erro e do castigo, ou do crime e da punição. A banalização da má-educação em casa e na escola, e do crime fora delas, é espantosa e tem consequências dramáticas que hoje não conseguimos mais avaliar. Sem limites em casa e sem punição de crimes fora dela, nada vai melhorar. Antes de mais nada, é dever mudar as leis – e não é possível que não se possa mudar uma lei, duas leis, muitas leis. Hoje, logo, agora! O ensino nas últimas décadas foi piorando, em parte pelo desinteresse dos governos e pelo péssimo incentivo aos professores, que ganham menos do que uma empregada doméstica, em parte como resultado de "diretrizes de ensino" que tornaram tudo confuso, experimental, com alunos servindo de cobaias, professores lotados de teorias (que também não funcionam). Além disso, aqui e ali grupos de ditos mestres passaram a se interessar mais por politicagem e ideologia do que pelo bem dos alunos e da própria classe. Não admira que em alguns lugares o respeito tenha sumido, os alunos considerem com desdém ou indignação a figura do antigo mestre e ainda por cima vivam, em muitas famílias, a dor da falta de pais: em lugar deles, como disse um jovem psicólogo, eles têm em casa um gatão e uma gatinha. Dispensam-se comentários.
Autoridade, onde existe, é considerada atrasada, antiquada e chata. Se nas famílias e escolas isso é um problema, na sociedade, com nossas leis falhas, sem rigor nem coerência, isso se torna uma tragédia. Não me falem em policiais corruptos, pois a maioria imensa deles é honrada, ganha vergonhosamente pouco, arrisca e perde a vida, e pouco ligamos para isso. Eu penso em leis ruins e em prisões lotadas de gente em condições animalescas. Nesta nossa cultura do absurdo, crimes pequenos levam seus autores a passar anos num desses lixões de gente chamados cadeias (muitas vezes sem sequer ter havido ainda julgamento e condenação), enquanto bandidos perigosos entram por uma porta de cadeia e saem pela outra, para voltar a cometer seus crimes, ou gozam na cadeia de um conforto que nem avaliamos.
Precisamos de punições justas, autoridade vigilante, uma reforma geral das leis para impedir perversidade ou leniência, jovens criminosos julgados como criminosos, não como crianças malcriadas. Ensino, educação e justiça tornaram-se tão ruins, tudo isso agravado pelo delírio das drogas fomentado por traficantes ou por irresponsáveis que as usam como diversão ou alívio momentâneo, que passamos a aceitar tudo como normal: "É assim mesmo". Muito crime, pouco castigo, castigo excessivo ou brando demais, leis antiquadas ou insuficientes, e chegamos aonde chegamos: os cidadãos reféns dentro de casa ou ratos assustados nas ruas, a bandidagem no controle; pais com medo dos filhos, professores insultados pela meninada sem educação. Seria de rir, se não fosse de chorar.
(In: Revista Veja. Lya Luft. 25/07/2009)
segunda-feira, 12 de julho de 2010
Pro Bilac II (*)
Há um tal amor
Que não é chamado de paixão
Estranho sentimento
Um encontro
Afetivo-intelectual
Sem muita explicação
Não se reconhece no corpo
Mas na admiração
Se satisfaz nas idéias
Se apraz nos prazeres
é cotidiano
Não dá saudade
Pois constante
Se lembra
Em qualquer ocasião
Amigo é bom
Mas, quando some,
é cobrada a atenção
Tem até a liberdade
De dizer o que quer
De dizer não
De fazer chorar
De ser feliz
De ouvir
O que se diz
De ser atriz
De responder
De recomendar
De suportar
De assistir
De ser
Amigo
Discute
Ouve
Cala
Pensa
Amigo fala
Conta casos
Repete histórias
Conta velhas e novas piadas
Fala de amores e desamores
Transações e frustrações
Amigo
Representa
Anima
Ironiza
Faz rir
Dá esporro
Ouve bronca
Amigo
Ronca
Amigo
Não tem censura
Vê os mesmos filmes
Ouve as mesmas músicas
Fala dos mesmos assuntos
Mas, engraçado,
Tem sempre conversas variadas
Amigo sempre se renova
Amigo
Marca
Se aborrece
Depois esquece
Amigo
Desaparece
E depois volta
Como se nada houvesse
Amigo
É sorte
Mas vai até a morte
Amigo
É místico e profano
Acende velas e incensos
Amigo
É racional e insano
Amigo aposta na loucura
E é careta
Amigo tem família
Amigo tem até cria
Amigo
Está sempre trabalhando
Divagando insone
Amigo some
Estudando
Fazendo provas
correções
Está sempre ocupado
Amigo dá plantão
Amigo faz serão
E dá um tempo
Pra mais um encontro
Amigo
Ainda sonha
Amigo
Vê lua e estrelas
No teto de um apartamento
Amigo
É incapaz de um fingimento
Amigo
Não é um momento de prazer
Amigo
é ter um prazer
Em cada momento
É estar no pensamento
Amigo
É sempre um novo desafio
Amigo
É rio
Amigo
É tudo
Amigo
É mudo
Amigo
É paz
Amigo faz
Amigo é natureza
Amigo é presa
Eterna lembrança
Amigo
É inconstância
E esse agradável prazer
de se contradizer
Amigo
É ter
Amigo
é samba
é rock
Amigo
é jazz
Amigo
é blue
Amigo
É uma presença que invade
Que enaltece
Amigo
Tece
Amigo
É o que divide
E se satisfaz em ajudar
É o ombro pra chorar
Que ri de qualquer bobagem
Que se diga
Amigo
Faz figa
Amigo
Não cobra
Amigo é obra
Mitifica
Critica
Pensa rápido
Amigo
Perdoa
Amigo
é sempre perdoado
Amigo
Não é coisa à toa
Amigo doa
Amigo é amado
Amigo
Cria
Copia
Inventa
Tenta
Amigo
Se sente à vontade
Amigo
Só tenta passar felicidade
Amigo bate na veia e na aorta
Amigo tem janelas e porta
Amigo
Sabe
Amigo invade
Amigo
não tem nexo
Amigo não tem sexo
Finalmente, amigo
Nos dá a liberdade
De estar chorando
De viver em vão
De viver em solidão.
E de morrer sorrindo
(“Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”)
(*)Do Marco Antônio, velho amigo sumido, autor do poema acima,
Para o Edilberto, novo amigo chegado...
Que não é chamado de paixão
Estranho sentimento
Um encontro
Afetivo-intelectual
Sem muita explicação
Não se reconhece no corpo
Mas na admiração
Se satisfaz nas idéias
Se apraz nos prazeres
é cotidiano
Não dá saudade
Pois constante
Se lembra
Em qualquer ocasião
Amigo é bom
Mas, quando some,
é cobrada a atenção
Tem até a liberdade
De dizer o que quer
De dizer não
De fazer chorar
De ser feliz
De ouvir
O que se diz
De ser atriz
De responder
De recomendar
De suportar
De assistir
De ser
Amigo
Discute
Ouve
Cala
Pensa
Amigo fala
Conta casos
Repete histórias
Conta velhas e novas piadas
Fala de amores e desamores
Transações e frustrações
Amigo
Representa
Anima
Ironiza
Faz rir
Dá esporro
Ouve bronca
Amigo
Ronca
Amigo
Não tem censura
Vê os mesmos filmes
Ouve as mesmas músicas
Fala dos mesmos assuntos
Mas, engraçado,
Tem sempre conversas variadas
Amigo sempre se renova
Amigo
Marca
Se aborrece
Depois esquece
Amigo
Desaparece
E depois volta
Como se nada houvesse
Amigo
É sorte
Mas vai até a morte
Amigo
É místico e profano
Acende velas e incensos
Amigo
É racional e insano
Amigo aposta na loucura
E é careta
Amigo tem família
Amigo tem até cria
Amigo
Está sempre trabalhando
Divagando insone
Amigo some
Estudando
Fazendo provas
correções
Está sempre ocupado
Amigo dá plantão
Amigo faz serão
E dá um tempo
Pra mais um encontro
Amigo
Ainda sonha
Amigo
Vê lua e estrelas
No teto de um apartamento
Amigo
É incapaz de um fingimento
Amigo
Não é um momento de prazer
Amigo
é ter um prazer
Em cada momento
É estar no pensamento
Amigo
É sempre um novo desafio
Amigo
É rio
Amigo
É tudo
Amigo
É mudo
Amigo
É paz
Amigo faz
Amigo é natureza
Amigo é presa
Eterna lembrança
Amigo
É inconstância
E esse agradável prazer
de se contradizer
Amigo
É ter
Amigo
é samba
é rock
Amigo
é jazz
Amigo
é blue
Amigo
É uma presença que invade
Que enaltece
Amigo
Tece
Amigo
É o que divide
E se satisfaz em ajudar
É o ombro pra chorar
Que ri de qualquer bobagem
Que se diga
Amigo
Faz figa
Amigo
Não cobra
Amigo é obra
Mitifica
Critica
Pensa rápido
Amigo
Perdoa
Amigo
é sempre perdoado
Amigo
Não é coisa à toa
Amigo doa
Amigo é amado
Amigo
Cria
Copia
Inventa
Tenta
Amigo
Se sente à vontade
Amigo
Só tenta passar felicidade
Amigo bate na veia e na aorta
Amigo tem janelas e porta
Amigo
Sabe
Amigo invade
Amigo
não tem nexo
Amigo não tem sexo
Finalmente, amigo
Nos dá a liberdade
De estar chorando
De viver em vão
De viver em solidão.
E de morrer sorrindo
(“Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”)
(*)Do Marco Antônio, velho amigo sumido, autor do poema acima,
Para o Edilberto, novo amigo chegado...
domingo, 11 de julho de 2010
Os filhos dos meus amigos
Yuri vai fazer 18 anos. O Dudu fez anteontem.
O Hugo e o Artur são campeões de skate profissional.
Ana Carolina já está namorando em casa.
O Ângelo vai fazer vestibular de Medicina.
Aléxia faz balé e ajuda a cuidar da irmã, Amanda.
O Agner é um mecânico nato. Já tem até macacão!
A Nayuri já é mãe
assim como a outrora pequena Dandara.
O Enzo eu só vi quando nasceu...
E nossos sonhos de ver os filhos correndo juntos tornaram-se realidade,
tão passageira que nem deu tempo de aproveitá-los.
Luís Arteiro chegou carregando a genética dos Nöthlich
e o priminho João também é a cara do pai
Serão as pimentinhas dos Pimentel...rs
Meu Artur chegou com dois primos: o Cauã e o Bê,
que ainda estava por nascer;
tem também uma prima, a Carol Carolina.
O Vinícius vai estudar com o Tutu quando crescer,
assim como a Laurinha e o meu Johan,
amiguinhos desde sempre, mesmo sem saber.
E o Giuli e a Cacá, que no início eram só nossos vizinhos,
me trouxeram de brinde o pai, Edilberto,
hoje meu amigo de infância e padrinho.
E a família Nascimento,
dando honra ao nome,
espera mais um rebento:
Miguel
que nos dará a honra da sua estreia
a qualquer momento...
O Hugo e o Artur são campeões de skate profissional.
Ana Carolina já está namorando em casa.
O Ângelo vai fazer vestibular de Medicina.
Aléxia faz balé e ajuda a cuidar da irmã, Amanda.
O Agner é um mecânico nato. Já tem até macacão!
A Nayuri já é mãe
assim como a outrora pequena Dandara.
O Enzo eu só vi quando nasceu...
E nossos sonhos de ver os filhos correndo juntos tornaram-se realidade,
tão passageira que nem deu tempo de aproveitá-los.
Luís Arteiro chegou carregando a genética dos Nöthlich
e o priminho João também é a cara do pai
Serão as pimentinhas dos Pimentel...rs
Meu Artur chegou com dois primos: o Cauã e o Bê,
que ainda estava por nascer;
tem também uma prima, a Carol Carolina.
O Vinícius vai estudar com o Tutu quando crescer,
assim como a Laurinha e o meu Johan,
amiguinhos desde sempre, mesmo sem saber.
E o Giuli e a Cacá, que no início eram só nossos vizinhos,
me trouxeram de brinde o pai, Edilberto,
hoje meu amigo de infância e padrinho.
E a família Nascimento,
dando honra ao nome,
espera mais um rebento:
Miguel
que nos dará a honra da sua estreia
a qualquer momento...
sábado, 10 de julho de 2010
Entre goleiros e roitweillers
Não se fala em outra coisa no momento. O (ex) goleiro Bruno, do Flamengo, está diretamente envolvido na morte de Eliza Samudio, mãe de seu filho menor e homônimo, tendo, inclusive, sido acusado de participação no enredo do trágico assassinato da moça, que foi desossada e teve sua carne devorada por cães da raça roitweiller.
Eu poderia aqui falar do preconceito a jogadores do Flamengo. Que eles são todos uns favelados, traficantes, viciados, mas eu me recuso a repetir essas leviandades. Poderia também reproduzir as piadas, como aquela do trocadilho com o ditado popular “prendam suas cabritas que meus roitweillers estão soltos”, mas eu me recuso a participar desse coro de sensos comuns repetidos pela mídia marrom.
A história é ainda mais medonha. Bruno teria cogitado matar também o bebê. Depois de ter passado por várias casas, o menor estava sob a guarda do avô materno, mas teve de ser entregue à avó materna, mãe de Eliza. Motivo: o avô foi acusado de estuprar outra filha quando a menor tinha 10 anos de idade. A mãe de Eliza abandonou a filha (por enquanto, oficialmente tratada como desaparecida) quando criança. Diz-se que a mãe de Bruno também o abandonou quando menino. O pai do jogador foi omisso em sua criação. Meu Deus, como será o futuro desse bebê desamparado?
Eliza foi uma menina que namorou vários jogadores de futebol, participou de orgias e fez filme pornográfico. Seu maior sonho era a pensão alimentícia do filho, que lhe daria uma vida de confortos. No fundo, tenho dó dessa moça: era uma pobre-coitada que viveu um sonho de princesa macabro. Não merecia o final que teve. Nem em épocas remotas, em sociedades altamente patriarcalistas, a promiscuidade foi punida de forma tal grotesca.
No fim das contas, o que eu acho é que todos nós deveríamos pensar nos valores que ensinamos para nossos filhos e filhas. Que eles vejam que os jogadores de futebol não são os heróis da história. Que ser modelo, atriz, “Maria Chuteira”, michê, ou qualquer coisa do gênero, não é tão glamouroso como a maioria das mães vêm tentando ensinar às filhas ansiosas para se tornarem emergentes. Que dinheiro traz conforto, sim, mas que existem outros bens que devemos ansiar em nossas vidas. Que não é vergonha ser humilde, ao contrário do que se em visto proclamar por aí. Que dinheiro não compra honra ... Me sinto até envergonhada de digitar aqui essas obviedades, pasmem.
Se Eliza tivesse uma noite de sexo com Mick Jagger e virasse primeira-dama de uma rede de comunicação, falaria bobagem em rede nacional e seria ovacionada por uma legião de fãs. Se fosse para um reality show, minimamente pousaria nua para uma revista masculina e ganharia o suficiente para comprar uma cobertura tríplex na Barra da Tijuca. Mas e se ninguém visse a ex-modelo-e-atriz sendo surrada, será que alguém daria sua falta? Seu sumiço estaria nos principais telejornais do país, quiçá do mundo? Seu filho estaria vivo? Bruno estaria impune e continuaria ídolo de muitos meninos?
Entre goleiros e roitweillers, o Brasil perdeu valores, perdeu senso de moral, perdeu o rumo entre o que é certo e errado. E ainda bem que perdeu a Copa, se não a Fátima Bernardes ainda estaria na porta do hotel da Seleção tentando uma última exclusiva antes da final.
Eu poderia aqui falar do preconceito a jogadores do Flamengo. Que eles são todos uns favelados, traficantes, viciados, mas eu me recuso a repetir essas leviandades. Poderia também reproduzir as piadas, como aquela do trocadilho com o ditado popular “prendam suas cabritas que meus roitweillers estão soltos”, mas eu me recuso a participar desse coro de sensos comuns repetidos pela mídia marrom.
A história é ainda mais medonha. Bruno teria cogitado matar também o bebê. Depois de ter passado por várias casas, o menor estava sob a guarda do avô materno, mas teve de ser entregue à avó materna, mãe de Eliza. Motivo: o avô foi acusado de estuprar outra filha quando a menor tinha 10 anos de idade. A mãe de Eliza abandonou a filha (por enquanto, oficialmente tratada como desaparecida) quando criança. Diz-se que a mãe de Bruno também o abandonou quando menino. O pai do jogador foi omisso em sua criação. Meu Deus, como será o futuro desse bebê desamparado?
Eliza foi uma menina que namorou vários jogadores de futebol, participou de orgias e fez filme pornográfico. Seu maior sonho era a pensão alimentícia do filho, que lhe daria uma vida de confortos. No fundo, tenho dó dessa moça: era uma pobre-coitada que viveu um sonho de princesa macabro. Não merecia o final que teve. Nem em épocas remotas, em sociedades altamente patriarcalistas, a promiscuidade foi punida de forma tal grotesca.
No fim das contas, o que eu acho é que todos nós deveríamos pensar nos valores que ensinamos para nossos filhos e filhas. Que eles vejam que os jogadores de futebol não são os heróis da história. Que ser modelo, atriz, “Maria Chuteira”, michê, ou qualquer coisa do gênero, não é tão glamouroso como a maioria das mães vêm tentando ensinar às filhas ansiosas para se tornarem emergentes. Que dinheiro traz conforto, sim, mas que existem outros bens que devemos ansiar em nossas vidas. Que não é vergonha ser humilde, ao contrário do que se em visto proclamar por aí. Que dinheiro não compra honra ... Me sinto até envergonhada de digitar aqui essas obviedades, pasmem.
Se Eliza tivesse uma noite de sexo com Mick Jagger e virasse primeira-dama de uma rede de comunicação, falaria bobagem em rede nacional e seria ovacionada por uma legião de fãs. Se fosse para um reality show, minimamente pousaria nua para uma revista masculina e ganharia o suficiente para comprar uma cobertura tríplex na Barra da Tijuca. Mas e se ninguém visse a ex-modelo-e-atriz sendo surrada, será que alguém daria sua falta? Seu sumiço estaria nos principais telejornais do país, quiçá do mundo? Seu filho estaria vivo? Bruno estaria impune e continuaria ídolo de muitos meninos?
Entre goleiros e roitweillers, o Brasil perdeu valores, perdeu senso de moral, perdeu o rumo entre o que é certo e errado. E ainda bem que perdeu a Copa, se não a Fátima Bernardes ainda estaria na porta do hotel da Seleção tentando uma última exclusiva antes da final.
sábado, 3 de julho de 2010
Johan e a Copa de 2010
Johan viu ontem o Brasil sair da Copa. É bem verdade que em 2006 ele também viu, mas não lembra. Essa foi a primeira copa da qual ele se lembrará pelo resto da vida. Tem 3 camisas, peruca e bandeira. Colecionou o álbum da Copa, fez tabela, queria o aniversário de 8 anos de Brasil, dormiu abraçado com as figurinhas dos jogadores, fez promessa na ponte dos desejos... e tudo para ver o Brasil perder do jeito que foi, um jogo de meninos perdidos em campo. Meu filho chorou, bastante. Na casa da amiga Vani, todo mundo tratou de consolar o menino... Por fim, quem conseguiu foi o Corélio, namorado da Mel, flamenguista roxo, que sacou a camisa vermelha e preta da mala e ficou sacudindo com o Johan, dizendo que aquele é que era o timão de verdade. Meu filho logo esqueceu as lágrimas, e deu para zoar o Rafa, tricolor incansável. Passados alguns minutos e todos nós já estávamos contentes de novo, rindo, comendo, bebendo e falando de nossos projetos de futuro (afinal, todas as meninas presentes eram feras em suas áreas profissionais e nossos almoços já rendem pontos no lattes...rs).
Na hora de vir embora, me deu um trem esquisito e resolvi retomar o assunto da Copa com o Johan. Contei pra ele que eu sou órfã da Copa de 1982, a primeira de que me lembro e acho que a maior decepção dos brasileiros até hoje. Ele pareceu se consolar com a minha história. Disse pra ele que nem sempre a gente ganha e que é preciso aprender a perder. Cantei pra ele o refrão que eu sempre lembro da Elis, "nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar...". Ele me ouviu. Parece que entendeu a moral da história. Tomara. Eu particularmente detesto essa onda de patriotismo sazonal!
Em tempo que jogador compra moto pra traficante, aparece em baile funk com bandido e é suspeito de matar a amante, eu tenho medo do que meu filho pode tomar como valores. E tenho medo também de outros filhos e alunos, que parecem ter seus valores morais corrompidos por essa sociedade.
E ainda tem gente que prefere falar mal do Dunga (só perdoo o Tadeu e o Escobar)... Desculpem o trocadilho, mas frente a tudo o que eu vi acontecer no mundo do futebol nos últimos dias, o Dunga é anão!!!
Na hora de vir embora, me deu um trem esquisito e resolvi retomar o assunto da Copa com o Johan. Contei pra ele que eu sou órfã da Copa de 1982, a primeira de que me lembro e acho que a maior decepção dos brasileiros até hoje. Ele pareceu se consolar com a minha história. Disse pra ele que nem sempre a gente ganha e que é preciso aprender a perder. Cantei pra ele o refrão que eu sempre lembro da Elis, "nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar...". Ele me ouviu. Parece que entendeu a moral da história. Tomara. Eu particularmente detesto essa onda de patriotismo sazonal!
Em tempo que jogador compra moto pra traficante, aparece em baile funk com bandido e é suspeito de matar a amante, eu tenho medo do que meu filho pode tomar como valores. E tenho medo também de outros filhos e alunos, que parecem ter seus valores morais corrompidos por essa sociedade.
E ainda tem gente que prefere falar mal do Dunga (só perdoo o Tadeu e o Escobar)... Desculpem o trocadilho, mas frente a tudo o que eu vi acontecer no mundo do futebol nos últimos dias, o Dunga é anão!!!
Amarrando bodes...
Estou no maior mau humor. De ontem pra hoje, depois que o Brasil perdeu a Copa, parece que tudo resolveu dar errado, à exceção da amiga Vani, que ganhou notícia de que foi promovida. Pois é, mas para mim a maré ficou braba. Aconteceu de tudo, desde esquecer de pagar umas contas (o que me gerou uma perda de grana de juros), até facada pelas costas (eu sempre insisto em dar crédito demais a gente que não é tão amiga). Tudo bem, é bem verdade que meu amigo Beto perdeu o emprego e está superpreocupado com a grana, porque tem dois filhos pequenos para criar, etc., mas ainda assim tô azeda: perdi uma prova importante para, de repente, mudar de emprego e ainda trabalhar com gente muito legal. Faz parte, estou tentando me convencer... Minha casa entrou em obra e tem poeira até o teto... faz parte! O Artur começou o dia com uma mega golfada, só não se afogou porque eu e Rafa estávamos prestando atenção nele... faz parte! Depois de tomar banho e estar cheirosinho, fez tudo de novo... faz parte! Descobri que quase perdi o emprego na facul porque estava grávida e pedi licença... faz parte! Paguei uma grana para fazer obra na casa alugada... faz parte! Tenho de ver um monte de comentarista idiota tentando fazer gracinha na TV... faz parte! O filho mais velho saiu com o pai para ver o jogo da Alemanha e, na hora de sair, quando viu o pai, parece que o menino esqueceu que tem mãe... faz parte! A amiga Candida que me desculpe, mas pro bode ficar completo, só falta a Argentina ganhar a Copa (não, isso não faz parte!!!!!).
terça-feira, 22 de junho de 2010
Solidão para Chico Buarque
Recebi hoje um e-mail do meu marido. Estranhei porque raramente o Rafa me manda alguma coisa pela internet. Abri e encontrei o texto abaixo, com uma declaração de amor. Esse tipo de delicadeza que a gente tem com o ser amado me emociona. É com esses pequenos mimos que a gente cativa o amor. O texto eu não sei se é do Chico mesmo, mas ainda vale a postagem.
Amor, amo você como naquele pôr-do-sol de 27 de maio de 2006.
Solidão
Solidão não é falta de gente para conversar, namorar, passear, fazer sexo.....
isto é carência.
Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar.....
isto é saudade.
Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe, às vazes, para realinhar os pensamentos....
isto é equilíbrio.
Solidão não é o claustro involuntário que o destino nos impõe compulsoriamente para que revejamos a nossa vida....
isto é um princípio da natureza
Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado...
isto é circunstância.
Solidão é muito mais que isso. solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma.
Francisco Buarque de Holanda
Amor, amo você como naquele pôr-do-sol de 27 de maio de 2006.
Solidão
Solidão não é falta de gente para conversar, namorar, passear, fazer sexo.....
isto é carência.
Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar.....
isto é saudade.
Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe, às vazes, para realinhar os pensamentos....
isto é equilíbrio.
Solidão não é o claustro involuntário que o destino nos impõe compulsoriamente para que revejamos a nossa vida....
isto é um princípio da natureza
Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado...
isto é circunstância.
Solidão é muito mais que isso. solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma.
Francisco Buarque de Holanda
Saramago e a Copa
Eu, Ana Cristina dos Santos Malfacini, cidadã brasieira, professora, uma das últimas pessoas do planeta a acreditar em valores éticos e morais, venho divulgar minha nota de repúdio a esta sociedade que pretere a homenagem à genialidade de um homem que se vai frente a um evento como a Copa do Mundo de 2010. Como ser pensante, acrescento que programas como a "Central da Copa", em que o apresentador fala mais bobagem do que qualquer outra coisa, me ofendem, e mais ainda me ofende uma ética em que o futebol passa a ser o centro das atenções do universo. A Saramago, fica aqui minha homenagem póstuma. Sem mais, subscrevo-me.
Ana Malfacini
Ana Malfacini
quinta-feira, 10 de junho de 2010
Equilibradora de Pratos II (ou a História dos Aindas)
Acordo às 4 da manhã e dou mamar (no peito) para o Artur. Às quartas ainda levanto às 4 e 30 para ir para o Rio trabalhar. Saio de casa às 5 para estar lá às 9. Pego três horas de engarrafamento e só volto para casa às 11 da noite. Em outros dias, divido a minha manhã com um Johan escorregadio que não quer fazer seus trabalhos de casa e com uma Eni chorosa da pressão alta e das dores de coluna. Terça e sexta tem a Bá aqui em casa para cuidar de todos, mas nos outros dias estamos entregues à sorte, porque a filha da Marina internou pra ter bebê (logo, ficaram suspensas as faxinas até segunda ordem). Quem tem me ajudado a segurar a onda é o Super-Rafa, meu supermarido-amigo-namorado, que tem sido ninja para se desdobrar em tudo (Amor, nunca vou poder retribuir com palavras todo o carinho que você tem me dado...).
Estou dando, ainda, aula de Português, Literatura e Redação para o Ensino Médio. Como eu não trabalhava Literatura fazia um tempão, estou estudando tudo de novo. Agora, por exemplo, acabei de ler Clarissa (E. Veríssimo), estou relendo Senhora (José de Alencar) e ainda estou lendo um livro pro Doutorado (Desabrigo e outros trecos, do Antonio Fraga). A tese eu deixei um pouco de lado, junto com o projeto de escrever dois livros - o de Produção Textual e o de poemas e contos: não estou dando conta desses projetos.
Artur e Johan estão com problemas alimentares. O Tutu trocou de leite e tem sofrido para fazer cocô. O Johan, limpa-trilho, está comendo até as paredes e não tem saído do banheiro. Ambos entraram de dieta. A mãe precisa retomar a dela correndo...
O carro tem de licenciar. Falta fazer a vistoria do gás. Minha licença para dirigir venceu. Para renovar, vou ter de me matricular na autoescola de novo, fazer prova escrita e ainda pagar por outro exame de vista.
Na faculdade, estou corrigindo os TCCs dos meninos. Todos me mandaram tudo na última semana, mais de 500 páginas para ler. Semana que vem tem banca e os alunos estão desesperados. Aparecerão mais uns 10 trabalhos ainda na minha caixa de e-mails. Na minha casa ainda tem uns 3 pacotes de prova para corrigir, não consegui pegar nenhum.
Hoje não consegui ir para a aula do Doutorado porque não tinha com quem deixar o filho menor, já que minha mãe está passando mal e o Rafa foi trabalhar. O filho mais velho tem festa do melhor amigo para ir e, ainda, alguém tem de ir pegar às 10 p. m. O carro teve de ficar na revisão. Estou literalmente a pé.
Agora, Artur dorme. A loja de móveis me liga dizendo que talvez chegue hoje a mobília comprada há um mês. O atraso foi culpa do frete, que veio de Santa Catarina. Ainda devo ficar presa em casa esperando o montador, para o quarto da Eni finalmente ficar pronto. Tenho de tirar as caixas da mudança ainda fechadas para os móveis e homens entrarem. A casa vai ficar numa bagunça ainda maior.
Na pia, a pilha de louças me olha enquanto digito meu texto... E ainda teve gente que me perguntou por que escolhi o nome Equilibradora de Pratos...
Estou dando, ainda, aula de Português, Literatura e Redação para o Ensino Médio. Como eu não trabalhava Literatura fazia um tempão, estou estudando tudo de novo. Agora, por exemplo, acabei de ler Clarissa (E. Veríssimo), estou relendo Senhora (José de Alencar) e ainda estou lendo um livro pro Doutorado (Desabrigo e outros trecos, do Antonio Fraga). A tese eu deixei um pouco de lado, junto com o projeto de escrever dois livros - o de Produção Textual e o de poemas e contos: não estou dando conta desses projetos.
Artur e Johan estão com problemas alimentares. O Tutu trocou de leite e tem sofrido para fazer cocô. O Johan, limpa-trilho, está comendo até as paredes e não tem saído do banheiro. Ambos entraram de dieta. A mãe precisa retomar a dela correndo...
O carro tem de licenciar. Falta fazer a vistoria do gás. Minha licença para dirigir venceu. Para renovar, vou ter de me matricular na autoescola de novo, fazer prova escrita e ainda pagar por outro exame de vista.
Na faculdade, estou corrigindo os TCCs dos meninos. Todos me mandaram tudo na última semana, mais de 500 páginas para ler. Semana que vem tem banca e os alunos estão desesperados. Aparecerão mais uns 10 trabalhos ainda na minha caixa de e-mails. Na minha casa ainda tem uns 3 pacotes de prova para corrigir, não consegui pegar nenhum.
Hoje não consegui ir para a aula do Doutorado porque não tinha com quem deixar o filho menor, já que minha mãe está passando mal e o Rafa foi trabalhar. O filho mais velho tem festa do melhor amigo para ir e, ainda, alguém tem de ir pegar às 10 p. m. O carro teve de ficar na revisão. Estou literalmente a pé.
Agora, Artur dorme. A loja de móveis me liga dizendo que talvez chegue hoje a mobília comprada há um mês. O atraso foi culpa do frete, que veio de Santa Catarina. Ainda devo ficar presa em casa esperando o montador, para o quarto da Eni finalmente ficar pronto. Tenho de tirar as caixas da mudança ainda fechadas para os móveis e homens entrarem. A casa vai ficar numa bagunça ainda maior.
Na pia, a pilha de louças me olha enquanto digito meu texto... E ainda teve gente que me perguntou por que escolhi o nome Equilibradora de Pratos...
terça-feira, 8 de junho de 2010
AS VERDADEIRAS MULHERES FELIZES, da Martha Medeiros, maravilhosa!!!
As verdadeiras mulheres felizes - Martha Medeiros
Acabo de ler um livro de Eliette Abecassis, uma francesa que eu não conhecia. O nome da obra, no original, é Un Heureux Événement, que pode ser traduzido para Um Feliz Acontecimento, mas é um título irônico, pois o livro trata sobre o fator que, segundo a autora, destrói as relações amorosas: o nascimento de um filho. Num tom exageradamente desesperado, a personagem narra o fim do seu casamento depois que dá à luz. Concordo que a chegada de uma criança muda muita coisa entre o casal, mas a escritora carrega nas tintas e cria um quadro de terror para as mães de primeira viagem. Se o nascimento de um filho é sempre desconcertante, é preciso lembrar que é, ao mesmo tempo, uma emoção sem tamanho. De minha parte, só tenho bons momentos a recordar, nada foi dramático. Mas mesmo que, por experiência própria, eu não compartilhe com a desolação da autora, ainda assim ela diz no livro uma frase muito interessante. Ao enumerar as diversas mazelas por que passam as criaturas do sexo feminino, ela me veio com esta: "os homens são as verdadeiras mulheres felizes".
Atente para a sutileza da frase. O que ela quis dizer? Que os homens saem pela porta de manhã e vão trabalhar sem pensar se os filhos estão bem agasalhados ou se fizeram o dever da escola. Os homens não menstruam, não têm celulite, não passam por alterações hormonais que detonam o humor. Os homens não se preocupam tanto com o cabelo e não morrem de culpa quando não telefonam para suas mães. Os homens comem qualquer coisa na rua e o cardápio do jantar não é da sua conta, a não ser quando decidem cozinhar eles próprios, e isso é sempre um momento de lazer, nunca um dever. Os homens não encasquetam tanto, são mais práticos. Eu, que estou longe de ser uma feminista e mais longe ainda de ser ranzinza, tenho que reconhecer o brilhantismo da frase: os homens são mulheres felizes. Eles fazem tudo o que a gente gostaria de fazer: não se preocupam em demasia com nada.
Porque nosso mal é este: pensar demais. Nós, as reconhecidas como sensíveis e afetivas, somos, na verdade, máquinas cerebrais. Alucinadamente cerebrais. Capazes de surtar com qualquer coisa, desde as mínimas até as muito mínimas. Somos mulheres que nunca estão à toa na vida, vendo a banda passar, e sim atoladas em indagações, tentando solucionar questões intrincadas, de olho sempre na hora seguinte, no dia seguinte, planejando, estruturando, tentando se desfazer dos problemas, sempre na ativa, sempre atentas, sempre alertas, escoteiras 24 horas.
Os homens, mesmo quando muito ocupados, são mais relax. Focam no que têm que fazer e deixam o resto pra depois, quando chegar a hora, se chegar. Não tentam salvar o mundo de uma tacada só. E a chegada de um filho, ainda que assuste a eles, como assusta a todos, é algo para se lidar com calma, é um aprendizado, uma curtição, nada de muito caótico. Eles não precisam dar de mamar de duas em duas horas, não ficam fora de forma, não enlouquecem. Isso é uma dádiva: os homens raramente enlouquecem.
Nós, nem preciso dizer. Nascemos doidas. Por isso somos tão interessantes, é verdade, mas felicíssimas, só de vez em quando, nas horas em que não nos exigimos desumanamente. Homens, portanto, são realmente as verdadeiras mulheres felizes. Que isso sirva de homenagem aos queridos, e sirva pra rir um pouco de nós mesmas, as que se agarram com unhas e dentes ao papel de vítimas porque ainda não aprenderam a ser desencanadas como eles.
Acabo de ler um livro de Eliette Abecassis, uma francesa que eu não conhecia. O nome da obra, no original, é Un Heureux Événement, que pode ser traduzido para Um Feliz Acontecimento, mas é um título irônico, pois o livro trata sobre o fator que, segundo a autora, destrói as relações amorosas: o nascimento de um filho. Num tom exageradamente desesperado, a personagem narra o fim do seu casamento depois que dá à luz. Concordo que a chegada de uma criança muda muita coisa entre o casal, mas a escritora carrega nas tintas e cria um quadro de terror para as mães de primeira viagem. Se o nascimento de um filho é sempre desconcertante, é preciso lembrar que é, ao mesmo tempo, uma emoção sem tamanho. De minha parte, só tenho bons momentos a recordar, nada foi dramático. Mas mesmo que, por experiência própria, eu não compartilhe com a desolação da autora, ainda assim ela diz no livro uma frase muito interessante. Ao enumerar as diversas mazelas por que passam as criaturas do sexo feminino, ela me veio com esta: "os homens são as verdadeiras mulheres felizes".
Atente para a sutileza da frase. O que ela quis dizer? Que os homens saem pela porta de manhã e vão trabalhar sem pensar se os filhos estão bem agasalhados ou se fizeram o dever da escola. Os homens não menstruam, não têm celulite, não passam por alterações hormonais que detonam o humor. Os homens não se preocupam tanto com o cabelo e não morrem de culpa quando não telefonam para suas mães. Os homens comem qualquer coisa na rua e o cardápio do jantar não é da sua conta, a não ser quando decidem cozinhar eles próprios, e isso é sempre um momento de lazer, nunca um dever. Os homens não encasquetam tanto, são mais práticos. Eu, que estou longe de ser uma feminista e mais longe ainda de ser ranzinza, tenho que reconhecer o brilhantismo da frase: os homens são mulheres felizes. Eles fazem tudo o que a gente gostaria de fazer: não se preocupam em demasia com nada.
Porque nosso mal é este: pensar demais. Nós, as reconhecidas como sensíveis e afetivas, somos, na verdade, máquinas cerebrais. Alucinadamente cerebrais. Capazes de surtar com qualquer coisa, desde as mínimas até as muito mínimas. Somos mulheres que nunca estão à toa na vida, vendo a banda passar, e sim atoladas em indagações, tentando solucionar questões intrincadas, de olho sempre na hora seguinte, no dia seguinte, planejando, estruturando, tentando se desfazer dos problemas, sempre na ativa, sempre atentas, sempre alertas, escoteiras 24 horas.
Os homens, mesmo quando muito ocupados, são mais relax. Focam no que têm que fazer e deixam o resto pra depois, quando chegar a hora, se chegar. Não tentam salvar o mundo de uma tacada só. E a chegada de um filho, ainda que assuste a eles, como assusta a todos, é algo para se lidar com calma, é um aprendizado, uma curtição, nada de muito caótico. Eles não precisam dar de mamar de duas em duas horas, não ficam fora de forma, não enlouquecem. Isso é uma dádiva: os homens raramente enlouquecem.
Nós, nem preciso dizer. Nascemos doidas. Por isso somos tão interessantes, é verdade, mas felicíssimas, só de vez em quando, nas horas em que não nos exigimos desumanamente. Homens, portanto, são realmente as verdadeiras mulheres felizes. Que isso sirva de homenagem aos queridos, e sirva pra rir um pouco de nós mesmas, as que se agarram com unhas e dentes ao papel de vítimas porque ainda não aprenderam a ser desencanadas como eles.
segunda-feira, 7 de junho de 2010
Curriculum Vitae (Conto)
Palavra. Vocábulo. Sei lá. A vida de Rosa era assim: muita palavra, muita explicação; tautologia. Na verdade, ela era obcecada pela palavra ideal, o momento certo de dizer a coisa certa - ou correta, melhor no contexto, para aprimorar a coesão textual. Algo assim, para entendermos sua excessiva preocupação metalingüística.
Esta era Rosa. Dois filhos, um menino e uma menina, um poodle e um marido que lhe era indiferente (com o pronome propositadamente ambíguo). Rosa era professora de Português, com matrícula no Estado e no Município, com algumas dezenas de tempos em escolas particulares de sua cidade e pouco tempo, muito pouco tempo para si e para os seus. Nas lacunas, o que sobrava do restrito tempo em casa (algo entre meia-noite e quatro da manhã), fumava (escondido) e se dedicava à palavra: estudos teóricos do léxico português.
Era feliz. Ou pensava ser, até receber aquela proposta, que na hora a fez encher-se de orgulho e logo depois de terror. A amiga professora de Matemática lhe avisara do concurso literário que haveria na região, uma excelente oportunidade de mostrar a todos seu talento e sua acurada percepção lingüística. A princípio, envaideceu-se com o convite, com o reconhecimento profissional...depois, desesperou-se, de tal forma que a colega atenta quase percebeu seu ligeiro rubor de face.
O que escrever? Qual seria o tema de seu texto? O que descrever, narrar ou dissertar? De repente, Rosa percebeu o que deveria ser-lhe óbvio desde sempre: a dolorosa percepção de que não havia assunto para escrever! Nesse fragmento de segundo, sua vida lhe passara à frente e vira centenas de cenas desfocadas em preto e branco: sua infância fora mesquinha e solitária, escondida atrás de brinquedos que nunca usara por medo de estragarem-se; sua escolha universitária foi feita por seus pais, porque moças de família só poderiam, quando muito, ser professoras; seu marido era, por conveniência, o irmão do noivo da prima, um bem sucedido e inculto comerciante local, a quem nunca amou; seus filhos nasceram sem lhe causarem dor, ou qualquer outro sentimento que os unisse além dos cordões umbilicais; seus pais eram velhos e sadios, sem nenhuma morte próxima que viesse lhe causar trauma, pena, sofrimento ou aprendizagem, ou qualquer coisa da qual ela pudesse tirar uma lição de vida realmente interessante.
Olhou o papel em branco e sentiu pena de sua vida enfadonha e correta. Nenhum amor, nenhuma aventura, nenhum erro, nada havia em sua frente, senão um cotidiano correto e metódico. Durante horas olhou o caderno pautado, até que as linhas azuis borraram-lhe os olhos e misturaram-se entre si. Dos livros que leu, das pessoas que conheceu, não conseguira extrair nada que pudesse lhe servir como tema. Pensou em escritores famosos e teve raiva, inveja de todos eles. Pensou em obras lidas, relidas, contadas e reescritas, nada valeu. Uma madrugada inteira sem que uma palavra lhe brotasse na mente.
Falta de inspiração, só podia ser falta de inspiração. Nada que um dia de trabalho não resolvesse. Com as crianças, certamente adviria uma idéia brilhante ou uma fagulha de reflexão a desdobrar. Só que, a cada minuto do dia, sua angústia só aumentava, ao ver palavras multiplicando-se de seus lábios, que de nada valiam ser escritas. Para quê? O concurso literário pressupunha, como o próprio nome dizia, literatura, e naquele momento o que a incomodava vorazmente era perceber que sua vida virara...gramática! Um conjunto de regras e exceções voltadas para uma modalidade culta, algo que aqueles alunos famintos e carentes não atingiam, o que os fazia a cada dia menores, devido àquele abismo lingüístico que os separava e que – ela tinha que confessar – a enchia de prazer e satisfação, até aquele momento.
Faltou-lhe o chão aos pés. De que adiantavam os adjuntos e os complementos nominais, se não lhe davam um assunto, uma literatura? (por mais que tivesse tentado fazer uma poesia com eles!). De que adiantavam os anos a fio em sala de aula, ensinando todos os filhos da cidade a escrever, se ela própria não sabia redigir um texto realmente seu, com suas idéias? Onde estava sua imaginação, se só no que pensava era corrigir e corrigir o que os outros diziam ou escreviam?
A dor que sentiu naquele momento talvez tenha sido a pior de sua vida inteira. Um misto de angústia, de piedade, de frustração por aquela vida pequena, desinteressante, escondida atrás de livros alheios em uma cidade do interior. Foi difícil perceber que as palavras, as quais ela sempre buscou e perseguiu, nunca lhe vinham na hora adequada porque ela simplesmente... não as sentia, não as vivia! Sua relação com elas era mecânica, artificial, passível de correções de certo e errado. Não eram as palavras quentes que enebriam poetas ou que arrebatavam bocas úmidas de namorados adolescentes. Não eram os gritos das crianças que brincam nas praças, ou a comemoração enérgica dos torcedores de futebol. Não eram as confissões arrependidas, ou o grito de prazer e dor de amantes apaixonados e lancinantes. Suas palavras não tinham vida, porque ela não tinha vida. A falta de vivacidade de suas palavras representava seu fracasso, o seu modo de viver, o grande cinza que era seu cotidiano.
Teve vontade de correr para um lugar que não existe, longe de tudo e de todos para viver uma vida sua, sem medo da opinião dos pais, filhos, marido, vizinhos, amigos, parentes, colegas, alunos, etc. A vontade passou e ela continuou sua rotina exatamente do jeito que era. O concurso literário era uma bobagem de jovens idealistas e verborrágicos. Coisa boba e desnecessária. Voltemos às aulas de Gramática.
Esta era Rosa. Dois filhos, um menino e uma menina, um poodle e um marido que lhe era indiferente (com o pronome propositadamente ambíguo). Rosa era professora de Português, com matrícula no Estado e no Município, com algumas dezenas de tempos em escolas particulares de sua cidade e pouco tempo, muito pouco tempo para si e para os seus. Nas lacunas, o que sobrava do restrito tempo em casa (algo entre meia-noite e quatro da manhã), fumava (escondido) e se dedicava à palavra: estudos teóricos do léxico português.
Era feliz. Ou pensava ser, até receber aquela proposta, que na hora a fez encher-se de orgulho e logo depois de terror. A amiga professora de Matemática lhe avisara do concurso literário que haveria na região, uma excelente oportunidade de mostrar a todos seu talento e sua acurada percepção lingüística. A princípio, envaideceu-se com o convite, com o reconhecimento profissional...depois, desesperou-se, de tal forma que a colega atenta quase percebeu seu ligeiro rubor de face.
O que escrever? Qual seria o tema de seu texto? O que descrever, narrar ou dissertar? De repente, Rosa percebeu o que deveria ser-lhe óbvio desde sempre: a dolorosa percepção de que não havia assunto para escrever! Nesse fragmento de segundo, sua vida lhe passara à frente e vira centenas de cenas desfocadas em preto e branco: sua infância fora mesquinha e solitária, escondida atrás de brinquedos que nunca usara por medo de estragarem-se; sua escolha universitária foi feita por seus pais, porque moças de família só poderiam, quando muito, ser professoras; seu marido era, por conveniência, o irmão do noivo da prima, um bem sucedido e inculto comerciante local, a quem nunca amou; seus filhos nasceram sem lhe causarem dor, ou qualquer outro sentimento que os unisse além dos cordões umbilicais; seus pais eram velhos e sadios, sem nenhuma morte próxima que viesse lhe causar trauma, pena, sofrimento ou aprendizagem, ou qualquer coisa da qual ela pudesse tirar uma lição de vida realmente interessante.
Olhou o papel em branco e sentiu pena de sua vida enfadonha e correta. Nenhum amor, nenhuma aventura, nenhum erro, nada havia em sua frente, senão um cotidiano correto e metódico. Durante horas olhou o caderno pautado, até que as linhas azuis borraram-lhe os olhos e misturaram-se entre si. Dos livros que leu, das pessoas que conheceu, não conseguira extrair nada que pudesse lhe servir como tema. Pensou em escritores famosos e teve raiva, inveja de todos eles. Pensou em obras lidas, relidas, contadas e reescritas, nada valeu. Uma madrugada inteira sem que uma palavra lhe brotasse na mente.
Falta de inspiração, só podia ser falta de inspiração. Nada que um dia de trabalho não resolvesse. Com as crianças, certamente adviria uma idéia brilhante ou uma fagulha de reflexão a desdobrar. Só que, a cada minuto do dia, sua angústia só aumentava, ao ver palavras multiplicando-se de seus lábios, que de nada valiam ser escritas. Para quê? O concurso literário pressupunha, como o próprio nome dizia, literatura, e naquele momento o que a incomodava vorazmente era perceber que sua vida virara...gramática! Um conjunto de regras e exceções voltadas para uma modalidade culta, algo que aqueles alunos famintos e carentes não atingiam, o que os fazia a cada dia menores, devido àquele abismo lingüístico que os separava e que – ela tinha que confessar – a enchia de prazer e satisfação, até aquele momento.
Faltou-lhe o chão aos pés. De que adiantavam os adjuntos e os complementos nominais, se não lhe davam um assunto, uma literatura? (por mais que tivesse tentado fazer uma poesia com eles!). De que adiantavam os anos a fio em sala de aula, ensinando todos os filhos da cidade a escrever, se ela própria não sabia redigir um texto realmente seu, com suas idéias? Onde estava sua imaginação, se só no que pensava era corrigir e corrigir o que os outros diziam ou escreviam?
A dor que sentiu naquele momento talvez tenha sido a pior de sua vida inteira. Um misto de angústia, de piedade, de frustração por aquela vida pequena, desinteressante, escondida atrás de livros alheios em uma cidade do interior. Foi difícil perceber que as palavras, as quais ela sempre buscou e perseguiu, nunca lhe vinham na hora adequada porque ela simplesmente... não as sentia, não as vivia! Sua relação com elas era mecânica, artificial, passível de correções de certo e errado. Não eram as palavras quentes que enebriam poetas ou que arrebatavam bocas úmidas de namorados adolescentes. Não eram os gritos das crianças que brincam nas praças, ou a comemoração enérgica dos torcedores de futebol. Não eram as confissões arrependidas, ou o grito de prazer e dor de amantes apaixonados e lancinantes. Suas palavras não tinham vida, porque ela não tinha vida. A falta de vivacidade de suas palavras representava seu fracasso, o seu modo de viver, o grande cinza que era seu cotidiano.
Teve vontade de correr para um lugar que não existe, longe de tudo e de todos para viver uma vida sua, sem medo da opinião dos pais, filhos, marido, vizinhos, amigos, parentes, colegas, alunos, etc. A vontade passou e ela continuou sua rotina exatamente do jeito que era. O concurso literário era uma bobagem de jovens idealistas e verborrágicos. Coisa boba e desnecessária. Voltemos às aulas de Gramática.
segunda-feira, 31 de maio de 2010
Eu gosto da tal da Semiótica...
A semiótica é um saber muito antigo, que estuda os modos como o homem significa o que o rodeia. Inicialmente, o termo foi encontrado da medicina, usado pelo médico Galeno de Pérgamo (139-199) para referir-se à diagnóstica (semiotikón méros). Séculos mais tarde, a semiótica propriamente dita teve seu início com filósofos como John Locke (1632-1704) e com Johann Heinrich Lambert (1728-1777), os quais relacionaram o nome Semiotiké ou Semiotik a uma doutrina de signos. Modernamente, o século XX foi inaugurado com pensadores como Edmund Husserl (1859-1938), que já postulava sobre uma teoria fenomenológica dos signos e significados, e por Charles Sanders Peirce (1839-1914), que é visto como uma das maiores figuras deste período, o fundador da teoria morderna dos signos, sobre o qual este trabalho se ocupará nas próximas páginas. Para Peirce, Semiótica é a doutrina formal dos signos. É a ciência dos signos e do processo significativo (semiose) na natureza e na cultura (Nöth, 1995:17), tendo como objeto de investigação todas as linguagens possíveis – artes visuais, músicas, fotografia, cinema, culinária, vestuário, gestos, religião, ciência, etc. Enfim, a Semiótica (do grego Semeiotiké ou “a arte dos sinais”) é a ciência de toda e qualquer linguagem, ocupando-se do estudo do processo de significação ou representação, na natureza e na cultura, do conceito ou da idéia, ou seja, de qualqer sistema sígnico, “de qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significado e sentido” (Santaella, 2006:13). A minha paixão pela semiótica americana aconteceu porque, além de dar conta de trabalhar com os meios surgidos com a globalização, sobretudo após a expansão das compras de computadores pessoais e com a popularização da mídias digitais, ela intrumentaliza o professor com uma base teórica consistente (na medida em que é pautada na Lógica) e abrangente (dado que é plenamente aplicável em qualquer signo, verbal, não-verbal ou sincrético) , tornando possível uma análise sígnica tridimensional. Por exemplo, a iconicidade é a base da contrução dos signos e um texto é um signo. Palavras também podem ser lidas como signos: quando usadas na direção de uma transparência visual, são signos orientadores, levando à univocidade do texto. Ao contrário, quando são signos desorientadores, levam ao equívoco ou à ambigüidade, fazendo com que o leitor chegue a uma imagem obscura, o que prejudica a interpretação textual (apud Simões e Dutra, 2002, in Simões, 2007). Interpretar é, em última análise, dialogar com os signos, dando a eles representações diversas. É estar-se integrado às coisas do mundo, o que compõe a bagagem cultural de cada um. Mas é também aprender, no convívio didático-pedagógico, com educadores que fornecem técnicas, subsídios para que melhor se possa decodificar, com olhar crítico, um texto. Com isso, percebe-se que cada leitor oferece mais à leitura do que aquilo que realmente aprendeu: ele coloca no texto suas vivências e experiências pessoais, o que nos acena para o fato de que a formação de leitores acaba se refletindo no aspecto além das letras. Esse dado mais uma vez reforça a importância da semiótica peirceana para o trabalho com o precesso ensino-aprendizagem: sua proposta triádica de classificação sígnica e seu modo de perceber a captação dos fenômenos remete à possibilidade de antigir-se uma análise global, levando a palavra (ícone de segunda) a ser vista, ao mesmo tempo, sob os focos semântico, progmático, estilístico, dentre outros (apud Rei, 2007; idem, ibidem).
O que você acabou de ler faz parte do meu projeto de Doutorado (por isso os termos técnicos e as refêrências bibliográficas - não copie, ok???). Na verdade, o que eu queria dar conta aqui é do meu gosto pela pesquisa, e as possibilidades maravilhosas que ela me abriu em sala de aula, na minha prática pedagógica.
Em anexo, postei um vídeo do youtube. Espero que você abra e se divirta com ele. De uma forma leve e humorada, uma garotada da Puc deu show em representar as semioses. É ou não é maravilhoso resgatar um objeto (que não está aqui) através de palavras (ícones) que o resgatem por uma semelhança sonora?
domingo, 30 de maio de 2010
Clarissa
Estou lendo Clarissa, de Érico Veríssimo. O livro trata da história de uma menina de 13 anos cujo maior sonho é andar de salto alto. A narrativa se passa na cidade de Porto Alegre, no início do século XX. Foi o segundo romance publicado pelo autor, em 1933. Segundo Érico, o enredo foi inspirado numa visão que ele teve da janela de seu apartamento: numa tarde de sábado ele vira uma normalista saltitante pela praça florida que ficava na frente do prédio onde morava. Foi o que bastou para ele escrever sobre os pensamentos e sonhos de uma menina prestes a descobrir que era mulher.
Clarissa tem para mim um gosto de nostalgia. Aliás, seu próprio nome já é uma pista de sua luz própria (clara, clareza, claridade, clarissa...). Ela é meio Poliana-moça: pensa bem de todo mundo e encara o mundo a sua volta com felicidade. Não gosta de matemática, mas é esforçada e faz todas as lições de casa. Católica, vai à missa aos domingos. É bem verdade que, no decorrer das páginas, a menina descobre o amargo sabor das mentiras, das desigualdades sociais e da morte de seu vizinho, mas, no geral, é uma menina alegre e disposta a encarar o mundo. Seu corpo se transforma no decorrer das páginas: ela vira uma moça roliça, de pernas bem feitas e com os seios que já se sobressaem nos vestidos.
Se fosse viva, Clarissa teria hoje cerca de 90 anos. Provavelmente, teria passado pela Revolução Sexual já com filhos crescidos e, portanto, não seriam seus os sultiens queimados em praças públicas. É possível que não conhecesse orgasmos e que tivesse feito bodas de ouro com um marido indiferente a seus caprichos femininos. Trabalhar fora? Jamais com as crianças pequenas e com os afazeres de casa, todos sob sua mais completa e total responsabilidade.
É provável que Clarissa tivesse uma bisneta de 13 anos em 2010, com o nome homônimo ao de sua bisavó. Não seria tão estudiosa, porque dividiria seu tempo livre com o msn, orkut, facebook, twitter e fotolog (isso sem contar com as aulas de inglês e com a academia). Teria muitas amigas, a quem encontraria nos shoppings no fim de semana, ocasião em que estaria de salto alto, ainda que meio desengonçada, e maquiagem. Seu maior sonho talvez fosse uma calça Planet Girls, ou um IPod. Desejaria um notebook só seu. Ainda não teria namorado, mas não seria mais BV, porque já teria ficado com uns carinhas do colégio. Com sorte, teria uma festa de 15 anos e uma viagem a Disney. Ao contrário da parenta distante, não gostaria de frutas. Doces, só no fim de semana - para não comprometer o manequim 36. E coca zero, sempre!!!
Não sei de qual Clarissa eu gostaria mais, mas eu acho que eu escolheria a do livro. A personagem, essa eu sei que vai ter sempre a mesma leveza da idade. Que o mundo de fora não vai lhe estragar o dia, o humor, os sonhos. Essa eu vou sempre achar no romance e, como num retrato antigo, poderá estar amarelada, mas com o mesmo sorriso.
E, com ela, eu continuarei sonhando (polianamente) com uma sociedade em que muitas clarissas nascerão todos os dias.
Clarissa tem para mim um gosto de nostalgia. Aliás, seu próprio nome já é uma pista de sua luz própria (clara, clareza, claridade, clarissa...). Ela é meio Poliana-moça: pensa bem de todo mundo e encara o mundo a sua volta com felicidade. Não gosta de matemática, mas é esforçada e faz todas as lições de casa. Católica, vai à missa aos domingos. É bem verdade que, no decorrer das páginas, a menina descobre o amargo sabor das mentiras, das desigualdades sociais e da morte de seu vizinho, mas, no geral, é uma menina alegre e disposta a encarar o mundo. Seu corpo se transforma no decorrer das páginas: ela vira uma moça roliça, de pernas bem feitas e com os seios que já se sobressaem nos vestidos.
Se fosse viva, Clarissa teria hoje cerca de 90 anos. Provavelmente, teria passado pela Revolução Sexual já com filhos crescidos e, portanto, não seriam seus os sultiens queimados em praças públicas. É possível que não conhecesse orgasmos e que tivesse feito bodas de ouro com um marido indiferente a seus caprichos femininos. Trabalhar fora? Jamais com as crianças pequenas e com os afazeres de casa, todos sob sua mais completa e total responsabilidade.
É provável que Clarissa tivesse uma bisneta de 13 anos em 2010, com o nome homônimo ao de sua bisavó. Não seria tão estudiosa, porque dividiria seu tempo livre com o msn, orkut, facebook, twitter e fotolog (isso sem contar com as aulas de inglês e com a academia). Teria muitas amigas, a quem encontraria nos shoppings no fim de semana, ocasião em que estaria de salto alto, ainda que meio desengonçada, e maquiagem. Seu maior sonho talvez fosse uma calça Planet Girls, ou um IPod. Desejaria um notebook só seu. Ainda não teria namorado, mas não seria mais BV, porque já teria ficado com uns carinhas do colégio. Com sorte, teria uma festa de 15 anos e uma viagem a Disney. Ao contrário da parenta distante, não gostaria de frutas. Doces, só no fim de semana - para não comprometer o manequim 36. E coca zero, sempre!!!
Não sei de qual Clarissa eu gostaria mais, mas eu acho que eu escolheria a do livro. A personagem, essa eu sei que vai ter sempre a mesma leveza da idade. Que o mundo de fora não vai lhe estragar o dia, o humor, os sonhos. Essa eu vou sempre achar no romance e, como num retrato antigo, poderá estar amarelada, mas com o mesmo sorriso.
E, com ela, eu continuarei sonhando (polianamente) com uma sociedade em que muitas clarissas nascerão todos os dias.
sexta-feira, 28 de maio de 2010
Gaivotas de Papel
Não lhe parece tão distante a lembrança de seu primeiro livro. O ano era 1977 e ele lhe fora dado como um presente por seus primeiros passos na leitura. A história (estória?) remota tratava de uma família de ursos que era visitada por uma menina de cabelos anelados, com fios tão dourados quanto os seus. O presente foi comemorado e datado com o mês do ano, grafado com uma caneta esferográfica de cor azul que há muito borrara o papel. Mas as manchas não foram suficientes para apagar a lembrança a qual hoje lhe vêem à mente. Sua sensação era a de uma expectadora invisível do passado que, como em terceira pessoa, voltasse à cena, assistindo de fora à sua premiação.
Livros lhe foram, desde então, pontuando momentos de glória – e terror. Não fora ainda na década de 80 que recebera sua primeira surra, de todas a mais violenta e humilhante. A surra que levara com um livro e por ele. Já seria difícil acreditar que seu maior algoz era o ventre que lhe pusera no mundo. Mais difícil seria supor que fosse alvejada por seu objeto de paixão. A mãe desfolhara a primeira cartilha em seu rosto e, a cada página caída, uma lágrima e um vergão que seria apenas suturado com a costura dos abecês posteriormente lhe ensinados. Logo ela que nunca havia imaginado que gaivotas de papel voando pela janela do prédio residencial tivessem um gosto tão amargo...
Mas entre as lembranças que escolheu para fazer de sua vida um conto-de-fadas, trouxe consigo, mesmo após décadas, a coleção de folhas revestidas e papel couché dos clássicos da literatura infantil. Não que já não conhecesse de longa data os personagens e as estórias, as tramas e seus desfechos: eles já eram velhos conhecidos que ora lhe passeavam em sonhos, ora lhe apareciam nos desenhos coloridos a trinta e seis lápis de cor. Só que, em sua coleção, tudo era perfeito e diferente. Aquela fora a primeira vez que vira personagens animados em livros. O papel que retratara o movimento, importado de algum país estrangeiro, mostrava à menina de subúrbio que nem tudo estava perdido. Sim, havia magia nos livros. Sim, gaivotas de papel poderiam ser doces. Sim, sua história também poderia ser cerzida a flores e pássaros, príncipes e princesas, todos felizes para sempre.
Toda essa profusão de sentimentos não durou mais que cinco segundos em sua lembrança. A visita à antiga residência no apartamento em que gaivotas não eram assim tão amargas trouxe-lhe à baila toda a infância. Seus livros foram redescobertos e com eles toda a sua história, as suas estórias, a dela e a deles... Ou seriam as nossas?
Foi com nostalgia, raiva e emoção, muita emoção, que desensacou, do guarda-roupa de solteira, um monte de livros de capa-dura há anos recolhido no armário, todos dentro de um saco que poderia ter embalado o lixo e não tantas recordações. Reviu, então, após milhares de dias e tantas outras cicatrizes, aqueles personagens animados que lhe figuraram a infância. Cheirou-os, apalpou-os, sorveu-os com a mesma curiosidade de há trinta anos. Uma lágrima poderia ter-lhe saltado dos olhos, não fosse a voz doce e meiga de criança curiosa, eufórica com a sua também descoberta:
- São para mim, mãe?
- São, meu filho. E eles esperaram por você uma vida toda...
(Esse texto é de minha autoria, escrito para um concurso de contos. Não sei em que data foi escrito, mas o ano foi 2005)
Livros lhe foram, desde então, pontuando momentos de glória – e terror. Não fora ainda na década de 80 que recebera sua primeira surra, de todas a mais violenta e humilhante. A surra que levara com um livro e por ele. Já seria difícil acreditar que seu maior algoz era o ventre que lhe pusera no mundo. Mais difícil seria supor que fosse alvejada por seu objeto de paixão. A mãe desfolhara a primeira cartilha em seu rosto e, a cada página caída, uma lágrima e um vergão que seria apenas suturado com a costura dos abecês posteriormente lhe ensinados. Logo ela que nunca havia imaginado que gaivotas de papel voando pela janela do prédio residencial tivessem um gosto tão amargo...
Mas entre as lembranças que escolheu para fazer de sua vida um conto-de-fadas, trouxe consigo, mesmo após décadas, a coleção de folhas revestidas e papel couché dos clássicos da literatura infantil. Não que já não conhecesse de longa data os personagens e as estórias, as tramas e seus desfechos: eles já eram velhos conhecidos que ora lhe passeavam em sonhos, ora lhe apareciam nos desenhos coloridos a trinta e seis lápis de cor. Só que, em sua coleção, tudo era perfeito e diferente. Aquela fora a primeira vez que vira personagens animados em livros. O papel que retratara o movimento, importado de algum país estrangeiro, mostrava à menina de subúrbio que nem tudo estava perdido. Sim, havia magia nos livros. Sim, gaivotas de papel poderiam ser doces. Sim, sua história também poderia ser cerzida a flores e pássaros, príncipes e princesas, todos felizes para sempre.
Toda essa profusão de sentimentos não durou mais que cinco segundos em sua lembrança. A visita à antiga residência no apartamento em que gaivotas não eram assim tão amargas trouxe-lhe à baila toda a infância. Seus livros foram redescobertos e com eles toda a sua história, as suas estórias, a dela e a deles... Ou seriam as nossas?
Foi com nostalgia, raiva e emoção, muita emoção, que desensacou, do guarda-roupa de solteira, um monte de livros de capa-dura há anos recolhido no armário, todos dentro de um saco que poderia ter embalado o lixo e não tantas recordações. Reviu, então, após milhares de dias e tantas outras cicatrizes, aqueles personagens animados que lhe figuraram a infância. Cheirou-os, apalpou-os, sorveu-os com a mesma curiosidade de há trinta anos. Uma lágrima poderia ter-lhe saltado dos olhos, não fosse a voz doce e meiga de criança curiosa, eufórica com a sua também descoberta:
- São para mim, mãe?
- São, meu filho. E eles esperaram por você uma vida toda...
(Esse texto é de minha autoria, escrito para um concurso de contos. Não sei em que data foi escrito, mas o ano foi 2005)
A equilibradora de pratos
O nome eu peguei emprestado da minha orientadora do mestrado, a Maria do Carmo (PUC-Rio). Ela dizia, entre muitas coisas, que a mulher contemporânea é uma equilibradora de pratos. A metáfora me soou agradável aos ouvidos: parece que eu vi uma personagem de circo louca para não deixar seus pratinhos no chão, para não deixar sua plateia decepcionada no fim do espetáculo, para parecer bonita e sorridente com o collant prateado, para receber as palmas e sorrisos no final do show...
Quase dez anos depois (meu Deus, quanto tempo!!!!), eu sou a Equilibradora de Pratos. Tenho marido e dois filhos, um de 7 anos e um de 5 meses. Minha mãe, uma senhora frágil de 70 anos, mora comigo. Sou professora, trabalho em muitas escolas, cursos e numa faculdade. Como se já não fosse o bastante, resolvi que voltaria a estudar e estou no meio do meu curso de Doutorado, em uma universidade que fica a 2 horas de viagem da minha casa. Aos sábados e domingos, tento administrar a casa e fazer mercado. Todo dia à noite estudo e preparo aula. Às terças, vou ao salão para fazer unha e cabelo. Às sextas, faço RPG e acupuntura, na tentativa de salvar minha coluna de uma crise. Diariamente, meu filho mais velho me cobra que faça com ele suas tarefas de casa. Meu bebê ainda mama no peito. Meu marido quer o colo cheiroso e disponível da mulher amada após um dia cansativo de trabalho... Quando dá, tento ser cronista, blogueira e poetisa.
Ao contrário do que muitos podem pensar, não reclamo da minha rotina. Reclamo da falta de grana, do filho que não dá valor ao que tem, do marido que não entende quando estou cansada demais para uma noite tórrida de amor, do governo que come parte do meu rendimento com o Imposto de Renda. No mais, reclamo também dos alunos, com a-maior-vida-boa, mas que não dão valor ao que têm (em sua maioria)... Em quase 100% das vezes sou feliz e me divirto com o que faço. Às vezes tenho vontade de chutar a sala de aula e fazer um concurso público para viver com as traças numa sala esquecida num almoxarifado qualquer. Passados 15 minutos a vontade passa e volto a amar tudo o que eu faço. Nas férias, morro de dó de ver as escolas vazias. Quando os meninos se formam, tenho orgulho em dizer que foram meus alunos. Alguns deles se tornaram amigos e até trabalham comigo.
Termino a minha primeira postagem com um pouco de nostalgia da faculdade e dos tempos de mestrado. O nome "Equilibradora de Pratos" mexeu um pouco comigo, meio que num antagonismo do do-que-eu-poderia-ter-sido em confronto com aquilo-que-realmente-sou. Minhas escolhas me definiram e me tornaram a Mulher (com M maiúsculo mesmo!!!!) que hoje enfrenta as crises de seu tempo, tentando da melhor maneira possível ser feliz. Há dez anos, quando eu ainda estava prestes a defender minha dissertação, eu tinha a juventude e seus prazeres, queria casar na igreja e tudo mais; naquela época a vida não era tão cheia de compromissos e tinha um viço e um gris que a gente só tem aos 20... Com as rugas, com o primeiro casamento desfeito, com a viagem à Europa que não rolou e com as estrias deixadas pela gravidez, vieram também os filhos e seus sorrisos, a certeza de um futuro mais tranquilo, o Mc Donald´s do fim de semana, e, no pacote, veio também a descoberta de que o silêncio pode ser confortável, que domingo é dia de juntar a família na cama de casal, e que na maior parte das vezes ser feliz é querer uma vida morna, menos Havaí e mais Cancun. Enfim, o manequim 44 não é a pior coisa do mundo, nem o Fantástico no fim de um domingo de chuva... Mas essas coisas a gente só descobre com o tempo...
A Adélia Prado acertou em cheio quando disse "Mulher é desdobrável. Eu sou.". Quanto a mim, ando numa fase mais humilde. Meu lema agora é "Mulher é desdobrável. Eu tento..."
Quase dez anos depois (meu Deus, quanto tempo!!!!), eu sou a Equilibradora de Pratos. Tenho marido e dois filhos, um de 7 anos e um de 5 meses. Minha mãe, uma senhora frágil de 70 anos, mora comigo. Sou professora, trabalho em muitas escolas, cursos e numa faculdade. Como se já não fosse o bastante, resolvi que voltaria a estudar e estou no meio do meu curso de Doutorado, em uma universidade que fica a 2 horas de viagem da minha casa. Aos sábados e domingos, tento administrar a casa e fazer mercado. Todo dia à noite estudo e preparo aula. Às terças, vou ao salão para fazer unha e cabelo. Às sextas, faço RPG e acupuntura, na tentativa de salvar minha coluna de uma crise. Diariamente, meu filho mais velho me cobra que faça com ele suas tarefas de casa. Meu bebê ainda mama no peito. Meu marido quer o colo cheiroso e disponível da mulher amada após um dia cansativo de trabalho... Quando dá, tento ser cronista, blogueira e poetisa.
Ao contrário do que muitos podem pensar, não reclamo da minha rotina. Reclamo da falta de grana, do filho que não dá valor ao que tem, do marido que não entende quando estou cansada demais para uma noite tórrida de amor, do governo que come parte do meu rendimento com o Imposto de Renda. No mais, reclamo também dos alunos, com a-maior-vida-boa, mas que não dão valor ao que têm (em sua maioria)... Em quase 100% das vezes sou feliz e me divirto com o que faço. Às vezes tenho vontade de chutar a sala de aula e fazer um concurso público para viver com as traças numa sala esquecida num almoxarifado qualquer. Passados 15 minutos a vontade passa e volto a amar tudo o que eu faço. Nas férias, morro de dó de ver as escolas vazias. Quando os meninos se formam, tenho orgulho em dizer que foram meus alunos. Alguns deles se tornaram amigos e até trabalham comigo.
Termino a minha primeira postagem com um pouco de nostalgia da faculdade e dos tempos de mestrado. O nome "Equilibradora de Pratos" mexeu um pouco comigo, meio que num antagonismo do do-que-eu-poderia-ter-sido em confronto com aquilo-que-realmente-sou. Minhas escolhas me definiram e me tornaram a Mulher (com M maiúsculo mesmo!!!!) que hoje enfrenta as crises de seu tempo, tentando da melhor maneira possível ser feliz. Há dez anos, quando eu ainda estava prestes a defender minha dissertação, eu tinha a juventude e seus prazeres, queria casar na igreja e tudo mais; naquela época a vida não era tão cheia de compromissos e tinha um viço e um gris que a gente só tem aos 20... Com as rugas, com o primeiro casamento desfeito, com a viagem à Europa que não rolou e com as estrias deixadas pela gravidez, vieram também os filhos e seus sorrisos, a certeza de um futuro mais tranquilo, o Mc Donald´s do fim de semana, e, no pacote, veio também a descoberta de que o silêncio pode ser confortável, que domingo é dia de juntar a família na cama de casal, e que na maior parte das vezes ser feliz é querer uma vida morna, menos Havaí e mais Cancun. Enfim, o manequim 44 não é a pior coisa do mundo, nem o Fantástico no fim de um domingo de chuva... Mas essas coisas a gente só descobre com o tempo...
A Adélia Prado acertou em cheio quando disse "Mulher é desdobrável. Eu sou.". Quanto a mim, ando numa fase mais humilde. Meu lema agora é "Mulher é desdobrável. Eu tento..."
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